O acesso à cidade

O que torna a mobilidade urbana insustentável? A começar que um modelo de mobilidade urbana que prioriza o transporte individual motorizado não é sustentável. Isso por-que induz o desrespeito aos modais ativos, eleva a quantidade de lesões e mortes no trânsito, estrangula as cidades e, sobretudo, acelera mudanças climáticas.

Iniciativas que contribuam para mudança desse cenário já começaram a ser executadas em Fortaleza, como os sistemas Bicicletar e Mini Bicicletar, que conseguiram evitar que 1.067 toneladas de CO2 fossem soltas na atmosfera. O Bicicleta Integrada conseguiu impedir 54 toneladas e o Sistema de Veículos Alterna-tivos para Mobilidade (Vamo), com 20 carros até o fim do último mês de julho, evitou 9,12 toneladas de CO2 emitidas. 

A Cidade sustentável também passa pelos caminhos de pessoas com deficiência. Nas páginas a seguir, o sociólogo Paul Hunt propôs um modelo que entende a deficiência não como uma enfermidade, mas que a falta de estrutura e serviços, por exemplo, impedem o bem-estar das pessoas com deficiência. Para isso, políticas vêm sendo criadas para atender essas pessoas que, por vezes, estiveram silenciadas. Uma das mais poéticas é o projeto Praia Acessível, que tem possibilitado, ao longo dos últimos três anos, que cadeirantes vejam o mar de perto e até tomem banho nas águas com cadeiras anfíbias. 

Este quinto caderno sobre mobilidade urbana encerra a série que debateu os modos de ir e vir da Cidade, com uma provocação - que faz às vezes de um apelo - o melhor é permanecer aumentando a oferta de opções de deslocamento para que todos usem menos o automóvel e dependam menos dele.

Boa leitura! 

Permitir o ir e vir

Fortaleza ainda enfrenta desafios para garantir o acesso a todos os espaços, mas se destaca na tentativa de se reestruturar

Por Isaac de Oliveira

Acessibilidade é uma garantia de que todas as pessoas, sem distinção, tenham direito à cidade. Para isso, é preciso que essa esteja ao alcance de todos, com ambientes convidativos e acesso facilitado. Ao longo dos anos, uma série de medidas vêm sendo adotadas para transformar não só a infraestrutura das cidades, mas a cultura da sociedade acerca da inclusão.
O próprio conceito de deficiência vem passando por um revés, onde a sua compreensão é vista não apenas da perspectiva médica, mas também social. O sociólogo Paul Hunt propôs um modelo que entende a deficiência não como uma enfermidade, mas que a falta de estrutura e serviços, por exemplo, impedem o bem estar das pessoas com deficiência. Esse entendimento permitiu que diversas políticas fossem criadas para atender essas pessoas que, por vezes, estiveram silenciadas.
“Trabalho com as questões de acessibilidade desde 2000 e vejo que estamos avançando nas adequações, principalmente depois que se tornou obrigatória com o decreto federal 5.296 de 2004. Antes disso, muito pouco acontecia nesse sentido. Fortaleza, atualmente, vem atuando com vários programas que beneficiam a implementação de acessibilidade urbana, bem como em edificações públicas e de uso coletivo”, avalia Zilsa Santiago, professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (UFC).


A especialista reconhece como positivas algumas iniciativas na Capital, como a instalação de passagens elevadas de travessia e os cruzamentos em X. “As passagens elevadas têm como objetivo a segurança viária, onde força a diminuição de velocidade do veículo e dá prioridade ao pedestre. Em algumas dessas faixas foram alargadas as calçadas, favorecendo maior segurança do pedestre”, explica.


Na avaliação de Zilsa, as calçadas, contudo, são o principal desafio do Município. Observação também de quem depende de uma estrutura adequada para se deslocar em segurança. Tiago Casal, 34 anos, perdeu a visão completamente aos cinco anos de idade, devido a uma retinose pigmentar. Morador da Caucaia, o tradutor de braille trabalha em Fortaleza e reconhece melhorias em algumas vias centrais, mas reclama da situação de áreas mais afastadas.
“Às vezes, as pessoas deixam objetos, resto de comida, móveis, carros estacionados ilegalmente. Por vezes a calçada é irregular, uma mais alta que a outra, um batente, uma rampa. A falta dessa padronização e coisas irregulares causam um transtorno para quem é deficiente. Houve melhoras com algumas intervenções da Prefeitura em padronizar, colocar pista tátil em alguns pontos, mas não se estendeu paras as regiões periféricas”, observa Tiago.

 

Um caminho acessível

Como Fortaleza tem readequado suas estruturas físicas para se tornar mais acessível a todos os usuários das vias urbanas

Por Isaac de Oliveira

Uma série de melhorias vêm sendo implantadas na Capital, como serviços de drenagem, terraplanagem, nova pavimentação e novas calçadas, em vias integrantes dos corredores expressos de ônibus, informa a Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinf). Ao todo, já foram implantados mais de 150 quilômetros (km) de extensão de calçadas com piso intertravado.

De acordo com a Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC), 60% dos semáforos que possuem botoeiras são contemplados com dispositivo sonoro para deficientes visuais. Dentro do programa de Apoio ao Pedestre, há 44 travessias elevadas para pedestres no entorno de escolas e unidades de saúde, distribuídas em 20 bairros. A Cidade conta também com 44 prolongamentos de calçada nos bairros Messejana, Rodolfo Teófilo e Vila União; cinco faixas em diagonal para pedestres nos bairros Cidade dos Funcionários, Conjunto Ceará, Aldeota, Benfica e Praia de Iracema; e duas de Trânsito calmo nos bairros Rodolfo Teófilo e Vila União.
No sentido de incentivar os deslocamentos a pé, por meio da qualificação dos passeios nas calçadas, a Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) também informa que o Plano Municipal de Caminhabilidade está em construção. Um dos produtos do plano, entregue no ano passado, o Caderno Técnico de Boas Práticas para Calçadas de Fortaleza, que traz informações técnicas e específicas para obras e melhorias nos passeios. “Considero que a condição das calçadas é um grande ponto negativo ainda. Visto que Fortaleza é uma cidade de característica plana, não tem grandes dificuldades para se alcançar este objetivo”, afirma Zilsa Santiago, professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC. E acrescenta: “Precisamos da sensibilização dos profissionais envolvidos, como também da sociedade em geral em termos de uma mudança de cultura, em que se tenha não só a aceitação, mas a consciência de que precisamos que a diversidade das pessoas tenham direito à cidade. Para isso, os ambientes precisam estar receptivos, convidativos, acessíveis e que contribuam com a qualidade de vida de todos”.

Acessibilidade nos meios de transporte

ÔNIBUS
Atualmente, 97% ou 2.068 veículos da frota cadastrada dos sistemas regular e complementar são adaptados.
Além dos elevadores, veículos acessíveis contam com assentos preferenciais, superfícies em textura diferenciada para identificação por pessoas cegas e espaços para usuários de cadeiras de roda.
Caso haja demanda de veículo especial para uma linha, deve-se apresentar a solicitação formalmente à Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor), por meio da ouvidoria (3452-9292) ou pela Central 156.

METROVIÁRIO
As linhas metroviárias operadas pela Cia. Cearense de Transportes Metropolitanos dispõem de rampas, elevadores, plataformas elevatórias, Carros Escaladores de Escada, piso tátil, mapa tátil e avisos sonoros.
Equipes presentes nas estações – compostas por agentes de estação e vigilantes - recebem treinamento especializado para ajudar no embarque e desembarque desses passageiros.
Por meio do Cartão Gratuidade Pessoa com Deficiência, o Metrô de Fortaleza registrou, em julho, 12.738 embarques de pessoas com deficiência na Linha Sul. Já na Linha Oeste, foram 1.260 embarques.

Praia Acessível. Projeto facilita o lazer na praia por meio da acessibilidade

Apesar de se estender por 573 quilômetros (km), o litoral cearense nem sempre esteve ao alcance de todos, pelo menos, de modo acessível. A faixa de areia é um impeditivo para quem possui, por exemplo, mobilidade reduzida. No Ceará, todavia, o projeto Praia Acessível tem possibilitado, ao longo dos últimos três anos, o lazer no litoral, que é característico do Estado.
Por meio da iniciativa, crianças, adultos e idosos com alguma deficiência e com mobilidade reduzida podem chegar perto do mar, cruzando uma esteira de 60 metros (m), que liga o continente ao oceano. E para quem ainda deseja se refrescar nas águas mornas do atlântico, o banho de mar é possibilitado através de cadeiras anfíbias.
Na Capital, o projeto do Governo do Estado acontece em parceria com a Prefeitura de Fortaleza e o Hotel Sonata, na Praia de Iracema, e já ofereceu 5.681 atendimentos desde abril de 2016. Na Praia do Cumbuco, a iniciativa é uma parceria com a Prefeitura de Caucaia e o Cumbuco Beach, e está à disposição desde junho do ano passado, o que permitiu a realização de 570 atendimentos. No total, são 6.251 pessoas atendidas até o final de julho deste ano.
“O projeto Praia Acessível é um dos projetos mais democráticos que existe, sem burocracia nenhuma. É chegar e usar”, convida Carlos Machado, coordenador do projeto, que funciona de quarta-feira a domingo, das 9h às 13 horas. Durante a alta temporada (janeiro, julho e dezembro), a programação se prolonga para todos os dias da semana, no mesmo horário.
Segundo Machado, a iniciativa tem capacidade para atender cerca de 50 pessoas diariamente. “O grande destaque do projeto não é a cadeira anfíbia, é a esteira, porque ela dá a possibilidade do deficiente chegar até próximo ao mar. Aqui (Praia dos Crush), com 60 metros, é a menor faixa de areia. Lá no Aterro, você tem 153 metros, que diferencia. Ou seja, é uma visão ingrata a pessoa poder ver o mar só do calçadão”, observa Machado. O militar do Exército André Nery, 41 anos, perdeu o movimento das pernas após ser vítima de uma bala perdida em 1998. Frequentador do Praia Acessível desde 2016, ele explica que o local já virou um espaço de socialização, onde ele vai sempre que pode.
“A minha relação com o projeto é desde o início. Eu vim sozinho mesmo. Moro aqui pertinho. Como morador, pra chegar até a beira da praia antes do projeto, tinha que pegar a cadeira, levantar a cadeira. Desde o acidente foram mais de 15 anos sem entrar no mar. Vinha à praia, mas ficava no calçadão. Aqui abriu vários leques”, reconhece André. (Isaac de Oliveira)

- O local reservado para o acesso dos usuários conta com piscina, frescobol e quadra de vo%u0302lei adaptados, ale%u0301m de esteiras e cadeiras anfi%u0301bias.
- Também são disponibilizadas vagas apropriadas para estacionamento e banheiro acessi%u0301vel durante os dias de funcionamento.
- O Governo do Ceará já investiu R$ 500 mil na aquisição de esteira de areia, cadeiras anfíbias, tendas, toldo, piscina infantil, mesas e cadeiras, motor, rede de vôlei, além de toda sinalização visual e guarda-vidas para garantir o banho dos usuários.
- O Município ficou responsável por colocar equipe multidisciplinar para operacionalizar o projeto junto ao Corpo de Bombeiros do Estado do Ceará.

Soluções perenes e benéficas para o meio ambiente

O Brasil se comprometeu internacionalmente a reduzir suas emissões de gases poluentes. Entenda como Fortaleza tem tentado cumprir sua parte

Por Luana Severo

Sabemos que o modelo de mobilidade urbana que prioriza o transporte individual motorizado é insustentável. Tanto porque vai de encontro ao estabelecido pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB) como porque induz o desrespeito aos modais ativos, eleva a quantidade de lesões e mortes no trânsito, estrangula as cidades e, sobretudo, acelera mudanças climáticas.
No Brasil, segundo o boletim Mobilidade de Baixo Carbono, do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), 48% das emissões de gases poluentes relacionadas ao uso de energia vêm do transporte motorizado. Ciente da responsabilidade que tem sobre o dano, o País se comprometeu, no Acordo de Paris, a reduzir essas emissões em 43% até 2030.
Fazer isso não é fácil. E, em Fortaleza, segundo Dante Rosado, coordenador da Iniciativa Bloomberg para a Segurança Viária Global na Capital, iniciativas nesse sentido só começaram a ser executadas quando a Cidade decidiu priorizar transporte público e ativo. “Se a mobilidade não for segura, não pode ser classificada como sustentável”.
O boletim do ITDP explica que, para uma cidade avançar na política de mobilidade de baixo carbono, é preciso, principalmente, promover um planejamento urbano integrado, intensificando a ocupação e o adensamento populacional e produtivo nos corredores de transporte; estimular o deslocamento por transporte público e ativo; e, por fim, aprimorar tecnologias para a eficiência energética de veículos e o uso de combustíveis menos poluentes.
Para Luiz Alberto Sabóia, secretário-executivo da Conservação e Serviços Públicos (SCSP), o modal cicloviário foi o precursor da mobilidade sustentável em Fortaleza, e devem dar prosseguimento a essa cultura os ônibus elétricos. “O ônibus elétrico tem ganhos ambientais muito claros porque emite zero poluentes. Além disso, tem uma questão de poluição sonora que praticamente é zero. E pode ser um instrumento de impacto tarifário positivo”, disse Sabóia. Neste sentido, o transporte público elétrico se mostra uma alternativa sustentável, inclusive, financeiramente.
Desde setembro de 2016, porém, o executivo municipal já tem testado outra experiência de mobilidade sustentável com automóveis elétricos. O sistema de Veículos Alternativos para Mobilidade (Vamo) opera com 20 carros distribuídos em 12 estações pela Cidade e fez mais de seis mil viagens até o fim do último mês de julho. Trajetos que, se feitos por veículos a diesel, teriam emitido 9,12 toneladas de CO2.

Redução de CO2 
Juntos, os sistemas Bicicletar e Mini Bicicletar já conseguiram evitar que 1.067 toneladas de CO2 fossem soltas na atmosfera. Já o Bicicleta Integrada conseguiu impedir 54 toneladas.
Sustentabilidade financeira
Recursos oriundos da Zona Azul Digital são destinados pela Prefeitura de Fortaleza à manutenção e expansão da rede cicloviária na Capital. Já os recursos arrecadados com os impostos pagos por motoristas de aplicativos de transporte individual privado são destinados à promoção de políticas para pedestres, incluindo correções de calçadas. Ambas as fontes são a forma que o executivo municipal encontrou de dar sustentabilidade financeira às principais políticas de mobilidade da Cidade.

Bate-pronto
 Guillermo Petzhold é coordenador de Mobilidade Urbana do WRI Brasil


O POVO - Quais são os pilares da mobilidade sustentável?

Guillermo Petzhold - A gente nunca pode dissociar a mobilidade do planejamento urbano da cidade. Então, a gente trabalha com a metodologia “evitar, mudar e melhorar”. Evitar deslocamentos através de um melhor planejamento urbano, que promova uso misto do solo, evite deslocamentos longos e favoreça os de curta distância. E, se a gente não puder evitar, a gente trabalha para mudar pros meios mais sustentáveis de transporte (coletivo e ativo) através de uma série de políticas. Se a gente não consegue nem evitar aquela viagem longa nem mudar como ela é feita, a gente trabalha para tecnologia através, por exemplo, da eletrificação, tanto de ônibus como de veículos de passeio.

OP - Como viabilizar economicamente e constituir como política pública esse modelo? 

Guillermo - Ao invés de termos projetos dissociados, termos planos que tragam alinhamento e visão de curto, médio e longo prazo. Que esses investimentos formem uma rede multimodal de transporte, favorecendo a política de mobilidade sustentável. E que siga o que se chama de pirâmide invertida de transporte, favorecendo primeiro o modo a pé, depois a bicicleta, depois o transporte coletivo e, por último, o automóvel.

OP - Quais são os principais benefícios para as cidades e, principalmente, para as pessoas?

Guillermo - Ao invés de termos projetos dissociados, termos planos que tragam alinhamento e visão de curto, médio e longo prazo. Que esses investimentos formem uma rede multimodal de transporte, favorecendo a política de mobilidade sustentável. E que siga o que se chama de pirâmide invertida de transporte, favorecendo primeiro o modo a pé, depois a bicicleta, depois o transporte coletivo e, por último, o automóvel.

OP - Quais são os principais benefícios para as cidades e, principalmente, para as pessoas?

Guillermo - Cada um dos meios de transporte sustentável traz diferentes benefícios. A mobilidade ativa traz, por exemplo, benefícios em termos de saúde, porque você está se exercitando fisicamente e não emite nada (de poluente), porque a energia vem do próprio corpo humano. E, nos deslocamentos a pé, há ganhos, inclusive, pro comércio. Você está indo mais devagar, pode olhar mais pro redor, vivenciar mais a cidade. Na parte do transporte coletivo, se comparado com o veículo de passeio, consegue transportar muito mais pessoas numa área menor e a pegada de carbono que gera é, também, menor. São esses tipos de benefícios que vão variar a partir do meio de transporte sobre o qual você estiver falando.

Acordo de Paris 
O Brasil, em 2015, junto a outros países signatários da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, assinou o Acordo de Paris. No termo, o País se comprometeu a reduzir 43% das próprias emissões de gases poluentes até 2030.

Cases no Brasil e no mundo

Alguns exemplos de experiências são reconhecidos pelas ações desenvolvidas no campo da mobilidade urbana e trouxeram diferentes benefício para as cidades e os usuários. Corredores exclusivos, transporte sustentável, acessibilidade são alguns dos critérios que elevam o desempenho de alguns municípios que foram premiados pela execução de políticas que surtiram efeitos no trânsito e no bem-estar da população, como o caso de Fortaleza.

Fortaleza
A capital cearense foi reconhecida internacionalmente pela sustentabilidade, ao receber, em janeiro de 2019, o Prêmio Transporte Sustentável, em Washington, D.C., nos Estados Unidos. De acordo com o comitê do prêmio do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), Fortaleza foi a cidade vencedora pela implementação de boas práticas em suas ruas desde 2014, incluindo ruas completas ou divisão equitativa do espaço viário; reduzir o CO2 e aumentar a segurança no trânsito priorizando o transporte público, o ciclismo e a caminhada.
Rio de Janeiro
A capital carioca se destaca nos investimentos em expansão do sistema de corredores expressos de ônibus (BRTs).
São Paulo
Desde 2018, a capital paulistana tem a meta de, em 20 anos, reduzir em praticamente 100% a emissão de poluentes da frota de transporte público e das empresas que prestam serviços de coleta de resíduos sólidos urbanos e hospitalares.
Belo Horizonte
Belo Horizonte foi o primeiro município brasileiro a desenvolver um plano de mobilidade alinhado à Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), o PlanMob-BH, que projeta ações para o horizonte do ano 2030.
Berlim
A capital da Alemanha se destaca pela diversidade de modais disponíveis e a facilidade de acesso a trens, ônibus, metrôs, carros e bicicletas, circulando em harmonia.  Outro destaque é o fomento de políticas públicas voltadas para o planejamento de vias para bicicleta e pedestres.
Uberlândia
A cidade mineira é referência em acessibilidade e já foi reconhecida pela ONU como uma das 100 cidades do mundo modelo em acessibilidade. O município criou, no ano 2000, o Núcleo de Acessibilidade, o que permitiu transformar a cidade para que todas as regiões fossem equipadas com as adaptações de inclusão necessárias e cuja população mudou seu modo de agir através da integração social.
Bogotá
Como Fortaleza, a capital da Colômbia é uma das cidades da América Latina que compõem a Iniciativa Bloomberg para Segurança Viária Global. Com o conceito “Visão Zero”, Bogotá tem avançado, principalmente, na gestão dos limites de velocidade seguros nas vias urbanas.
Hong Kong
O principal centro de negócios e turismo da Ásia passeia o sistema MTR (Mass Transit Railway), considerado um dos mais eficazes do mundo. Esse meio de transporte é o mais popular da região e funciona como uma linha de trem super rápida, atendendo Hong Kong e regiões próximas.

 

Os bosques, presentes!

A principal causa da perda de biodiversidade, da cidade inundada pela chuva e do calor que aumenta a cada arvore cortada, é o capital imobiliário. Como acessar os sistemas ambientais que controlam a vida? Em qual lugar nos conectar com todas as espécies na urbi? O manguezal, nos baixos cursos fluviais dos rios da nossa cidade, é parte do nosso imaginário? Esse é o problema fundamental: a mercantilização da natureza torna inacessível - até no imaginário - as áreas verdes da Cidade. Basta comparar uma árvore do bosque de manguezal com um poste de luz: o poste é repleto de códigos, senhas, letreiros e identificados individualmente pelos aplicativos; uma árvore, anônima. É claro que os bosques promovem e iluminam nossas vidas, amenizam o clima urbano, controlam as enchentes, abrem os caminhos para florescer a reserva de água doce no subsolo. Cada poste tem uma importância e, por isso, visibilidade. Cada conjunto de árvores tem um problema para os especuladores imobiliários, e por isso a morte. As dunas de Sabiaguaba, protegidas pelo parque natural municipal, com dunas móveis, bosques de matas arbóreas fixando as dunas, manguezais, aquíferos e lagoas, sítios arqueológicos, ainda resguardam biodiversidade. As dunas do Cocó, negociadas com o capital imobiliário (e sua possível extinção), ainda resistem com a força dos movimentos sociais e ambientalistas. Entretanto, encontram-se invisibilizadas pela administração pública, árvores são descartadas, lagoas soterradas, dunas desnatadas: são ameaças para a mercantilização do solo. As centenas de denúncias - tráfego de veículos esmagando os registros de povos ancestrais, de aterros com materiais de construção contaminando e impermeabilizando o solo, dos desmatamentos seletivos e orientados pelo mercado imobiliário – foram caladas, evitadas, arquivadas. Acessibilidade inversa, degradação programada? É de colapsar o imaginário, é de fragmentar as conexões que dão suporte à natureza: as áreas verdes, onde as complexas conexões promovem bem-viver, são o lugar da sanha dos especuladores e do Estado conivente. O sentimento de que as áreas verdes e parques da cidade são fundamentais, e estão sendo atacados por tratores e motosserras, nos resta ocupá-los com a razão e a resistência popular. Acessar os espaços iluminados pela fotossíntese, regados pelo orvalho, repletos de organismos que nos ajudam a respirar e a florescer os bosques, parece ser a única opção diante do descaso institucional. Os bosques com pessoas, as pessoas com bosques no imaginário, as aves e cantos, as abelhas e néctar – passos coletivos sobre as trilhas, sinfonias de fauna e flora, zumbidos sobre as arvores, no ar, água e no solo – esse é o lugar de acessibilidade com poder, da alegria coletiva de viver, espaço para filtrar a água de beber, e sem asfalto. Sentir a natureza, contemplar as marés inundando o manguezal, cosmos e biodiversidade se encontrando, não devem ser reféns do mercado imobiliário. Nos resta uma opção diante da rápida e feroz mercantilização da natureza da nossa cidade: acessar os parques, desfrutá-los. E não alienados, pois é essa a razão que destrói os vínculos da vida de todas as espécies, e que alimenta somente os valores estéticos e funcionalista dos ecossistemas, estratégias de acumulação de capital, mercadoria. Acessibilidade e justiça ambiental nos aproximam: áreas verdes concretas, bosques bens comuns e anticapitalistas. Ao sentir que somos parte um do outro, vida e árvores, água e calor, vento e respiração, abelhas e olfato, estaremos acessando, agora e no futuro das mudanças climáticas, bosques de pé, ecossocialistas e a cidade saudável.

Jeovah Meireles 
Professor Doutor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Movimento Urbano #01

A mobilidade é um assunto que interessa a todos, independente do meio que se use para se locomover.

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