O deslocar pela cidade

Quanto tempo você leva para ir e voltar de casa para o trabalho? Essa é a questão central do planejamento de mobilidade urbana em países do mundo todo. “Sair de casa cada vez mais cedo e retornar mais tarde para diferentes atividades interfere fortemente na qualidade de vida do cidadão”, afirma o professor Doutor da UFC/PUC-Rio, José Borzacchiello da Silva.

Fortaleza tem corrido em busca desse menor tempo. Para os ônibus, atualmente, contabiliza mais de 100 quilômetros (km) de faixas destinadas para o transporte coletivo, localizadas em quase 40 ruas e avenidas da Capital. Ao todo 358 linhas compõem o Sistema de Transporte Urbano da Capital, distribuídas em 2.124 veículos (ônibus e vans), segundo dados da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza S. A. (Etufor). Passeamos por elas para identificar as lombadas estratégicas e as velocidades alcançadas. 

Metrô também é uma solução real. A frota da linha Sul é formada por 12 trens, sendo que dois reservas para casos de manutenção ou intercorrência. Os outros dez circulam agrupados em dois e atingem uma velocidade média de 60km/h. O desafio atual da gestão é reduzir o intervalo médio de 17 minutos entre um trem e outro. Haverá de se automatizar o processo. 

O que se percebe neste quarto caderno sobre movimento urbano é que a solução para os transportes tem de estar integrada ao planejamento de cidade pretendida. A ideia é que os deslocamentos se tornem cada vez mais facilitados e diversificados, sejam eles individuais, coletivos, tradicionais ou disruptivos.

Boa leitura! 

Solução na coletividade

Ônibus ainda têm lugar central na mobilidade urbana de Fortaleza

Por Isaac de Oliveira

Novos modelos de transporte ganharam espaço na reconfiguração espacial e cultural de diversas cidades brasileiras nos últimos anos. Como em tantas delas, contudo, em Fortaleza, os ônibus permanecem na dianteira do transporte coletivo. Quinta maior cidade em população do Brasil, a capital cearense possui um sistema de ônibus robusto, que atende cerca de 1 milhão de pessoas por dia. Não obstante, o modal, pela sua capacidade de atendimento, merece destaque quando o assunto é mobilidade urbana.

Numa cidade em que 53,9% da frota é composta por automóveis (611 mil) e 26,3% por motocicletas (298 mil), em maio de 2019, segundo o Departamento Estadual de Trânsito (Detran-CE), é fundamental garantir espaço e preferência para os ônibus nas vias, a fim de que estes ganhem mais agilidade nos deslocamentos.

“Ônibus é a melhor aposta, desde que se você identificar que tem ônibus preso em congestionamento, você dê um jeito de fazer um espaço exclusivo para ele. Que é o que tem sido feito. Se você colocou os ônibus correndo, você resolveu o problema de mobilidade de um monte de gente. O automóvel não precisa ter muita pressa porque, historicamente, tudo foi feito muito para ele. Tanto é que eles são muitos”, pondera Mário Azevedo professor do Departamento de Engenharia de Transportes (DET) da Universidade Federal do Ceará (UFC).

As faixas exclusivas estão entre as principais apostas da gestão municipal para reduzir os tempos de viagem, evitando que os coletivos disputem lugar em congestionamentos. Ao longo dos últimos anos, diversas vias foram adaptadas e, atualmente, já são mais de 100 quilômetros (km) de faixas destinadas para ônibus, localizadas em quase 40 ruas e avenidas da Capital.

Mário reconhece que os tempos de viagem no sistema de transporte urbano diminuíram, entretanto, lembra que o município ainda permanece com o desafio da lotação, sobretudo nos horários de pico. Para o especialista, é necessidade descongestionar os caminhos para os coletivos. “Resolver o problema dos ônibus e dar mais velocidade para eles favorece a maioria da população. Acho a política de vias e faixas exclusivas uma boa (alternativa) e pode até aumentar”, reforça.

Conforme Victor Macêdo, engenheiro da Prefeitura de Fortaleza, uma pesquisa Origem/Destino, estudo comum em cidades com grande volume populacional, está em curso na capital cearense. A última do tipo data de 1996. A pesquisa, que já está cerca de 60% concluída, percorrerá 23 mil domicílios com o objetivo de identificar como os entrevistados fazem seus deslocamentos. O objetivo é que os resultados possam orientar o poder público no redesenho do sistema para melhor atender às necessidades da população.

“A pesquisa está em andamento para a gente conseguir ter esse diagnóstico de quais são as principais linhas de desejo da população. Será que ela hoje não faz rotas negativas? Quer ir para o Centro e é obrigada a passar pelo terminal por desconhecer o sistema? A gente quer conhecer essa demanda para poder planejar muito melhor o sistema e viabilizar a oferta que a gente tem”, explica Macêdo. 

O sistema de ônibus

As estratégias para oferecer aos usuários menos tempo de viagem e aumento de velocidade dos ônibus

Atualmente, 358 linhas compõem o Sistema de Transporte Urbano da Capital, distribuídas em 2.124 veículos (ônibus e vans), informa a Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza S. A. (Etufor). Parte deles deslocam-se também entre os terminais de integração, sete no total. Os mais movimentos deles, Papicu e Antônio Bezerra, recebem um fluxo de mais de 267 mil e 189 mil pessoas por dia, respectivamente.

Victor Macêdo, engenheiro da Prefeitura de Fortaleza, reconhece a existência de gargalos, mas explica que parte dos problemas tem origem na forma como o transporte coletivo se desenvolveu. “Nosso sistema de transporte público veio crescendo sob demanda de população. Por exemplo, uma comunidade que pedia uma linha para ligar o bairro até o Centro. Ele foi crescendo, acompanhando os limites da Cidade. A pesquisa Origem/Destino vai orientar como a gente pode se reorganizar”, acrescenta Macêdo.

Enquanto os resultados não saem, outras estratégias vêm sendo postas em prática, como a expansão de corredores exclusivos, integração com outros modais, a renovação da frota com veículos com ar-condicionado e internet wi-fi e, mais recente, a criação de um projeto-piloto de linhas com tarifa reduzida. A iniciativa permite que moradores de alguns bairros se desloquem para uma centralidade próxima - bairro com comércio mais desenvolvido - pagando uma passagem mais barata, no valor de R$ 1.

Cinco linhas desse tipo estão em circulação: Conjunto Yolanda Queiroz, Circular/Nova Assunção, José Walter/Cidade Jardim, José Walter Orgulho do Ceará, Caça e Pesca/Sabiaguaba. Quem utiliza o Bilhete Único, tem a vantagem da integração temporal, benefício que possibilita, em até duas horas, fazer a troca com outras linhas, neste caso, pagando apenas a diferença no valor da passagem.

De acordo com a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Fortaleza tinha, em janeiro deste ano, a 16ª tarifa (R$ 3,60) mais cara entre as capitais do País. No topo da lista, Belo Horizonte, com passagem a R$ 4,50. Já no final do ranking, Recife com tarifa de R$ 3,20.

Mudanças que vêm sendo criadas ao longo dos anos já começam a ser sentidas pelos usuários. A publicitária Andressa Moura, 24, utiliza ônibus nos dias úteis para ir de casa, no Parque Manibura, ao trabalho, na Aldeota. Ao todo, são quatro ônibus por dia, uma vez que ela precisa passar pelo terminal de integração do Papicu.

“A minha rota, pelo menos na semana, passa ônibus a cada 15 minutos. Eu acho tranquilo. As linhas que eu pego têm ar-condicionado, e o horário (11h) é favorável”, avalia Andressa.

 

BRT

 

Solução de trânsito adotada em diversas cidades, Fortaleza conta, atualmente, com duas estruturas de Transporte Rápido por Ônibus ou BRT (Bus Rapid Transit) em funcionamento. O primeiro a entrar em operação, localizado na avenida Bezerra de Menezes, foi inaugurado em 2015. Em média, cerca de 49 mil pessoas trafegam por dia nas nove linhas que circulam pelo corredor. Em dezembro passado, foi inaugurado o BRT da avenida Aguanambi, que se estende por dois quilômetros e conta com quatro estações.

“O BRT tem a pista mais livre. Nesse aspecto, ele ganha em velocidade. Quando se embarca, não tem que subir e descer escada pois o piso do ônibus está no mesmo nível da estação. Você já tem outro ganho de tempo”, explica o professor Mário Azevedo, do Departamento de Engenharia de Transportes (DET) da UFC.

Segundo a Prefeitura, nos três primeiros anos de funcionamento, o corredor da Bezerra de Menezes ofereceu um ganho de 52% na velocidade no percurso entre os terminais Papicu e Antônio Bezerra. A Divisão de Monitoramento da Etufor constatou que a velocidade média dos coletivos subiu de 12km/h para 18,32 km/h.

Com menos tempo de operação, o BRT da Aguanambi ainda passa por avaliações. Nos três primeiros meses, a velocidade média comercial da via dobrou de 12km/h para 24km/h. A expectativa é que a malha de corredores seja expandida.

“Temos muitas linhas que se sobrepõem. A gente quer redesenhar as linhas, trabalhar todas as integrações”, projeta Victor Macêdo, engenheiro da Prefeitura. (Isaac de Oliveira)

 

PASSAGEIROS

 

Fluxo no Sistema de Transporte Urbano de Fortaleza (referência: 2013 a 2019)

 

maio/2013 - 26.312.183

maio/2014 - 30.053.209

maio/2015 - 29.326.692

maio/2016 - 28.210.650

maio/2017 - 26.944.746

maio/2018 - 26.820.098

maio/2019 - 25.993.326

 

Número de usuários que trafegam no sistema de ônibus por dia em Fortaleza (referência: maio/2019)

 

Média diária em dias úteis: 

 

992.928

 

Média diária aos sábados: 

 

640.194

 

Média diária aos domingos: 

 

317.628

 

Obs: O dia 1º de maio, feriado de Dia do Trabalho, foi considerado um dia de domingo para o cômputo da média.

 

TERMINAIS

 

Número de usuários que trafegam pelos terminais de integração de Fortaleza (referência: maio/2019)

 

Terminal da Lagoa: 47.441

Terminal da Messejana: 143.947

Terminal da Parangaba: 189.534

Terminal do Antônio Bezerra: 212.522

Terminal do Conjunto Ceará: 65.193

Terminal do Papicu: 266.898

Terminal do Siqueira: 141.063

Tempo deve ser reduzido à metade

Linha Sul teve aumento de público de 84% entre 2015 e 2018. Sinalização deve ser implantada até o fim do ano para aperfeiçoar o modal

Por Isaac de Oliveira

Quando há possibilidade, o metrô é a escolha certa para Regilane Araújo, 31 anos. Moradora do Mondubim, em Fortaleza, ela utiliza o modal para ir todos os dias à faculdade, na Parangaba, e, algumas vezes no mês, também ao Centro da Cidade, quando precisa comprar artigos para sua loja. Custo e agilidade estão entre as vantagens que a comerciante encontra nesse meio de transporte. “Acho que é uma das melhores opções por conta da rapidez. Tenho carro, mas prefiro ir de metrô porque são 15 minutos que eu levo (de casa ao Centro), e o custo é bem menor”, avalia Regilane.

O sistema metroviário de Fortaleza e Região Metropolitana é formado pelas linhas Sul (metrô), Oeste e pelo Ramal Parangaba-Mucuripe, sendo os dois últimos operados por Veículos Leves sobre Trilhos (VLT). A Linha Sul foi inaugurada em 2012, em operação assistida, e só a partir de 2014, funciona em operação comercial. Com sistema eletrificado, ela é atualmente a maior via de transporte de passageiros sobre trilhos em operação no Ceará, tanto em extensão (24,1 km), como em número de estações (19) e de passageiros (34 mil/dia).

A frota da linha Sul é formada por 12 trens, sendo que dois são reserva para casos de manutenção ou intercorrência. Os outros dez circulam agrupados em dois e atingem uma velocidade média de 60km/h. O desafio atual da gestão é reduzir o intervalo médio de 17 minutos entre um trem e outro.

Segundo o diretor-presidente da Cia. Cearense de Transportes Metropolitanos, Eduardo Hotz, esse tempo se deve a uma questão de segurança, porque os trens precisam manter entre si uma certa distância. Contudo, até o final deste ano, deverá ser finalizada a instalação de um sistema de sinalização, o que permitirá uma automatização dos trens, hoje operados por pessoas. Com a mudança, o tempo de espera deverá ser reduzido à metade.

“O resultado disso (sistema de sinalização) é que nós poderemos utilizar a frota que dispomos, dos 12 trens, e poderemos chegar em torno de oito minutos de intervalo. Com isso, nós facilitaremos muito a vida das pessoas. Como a confiabilidade é maior e o intervalo passa a ser pequeno, tem muito mais atratividade o sistema porque terá menos tempo de espera”, explica Eduardo.

Na avaliação de diretor, o metrô vem ganhando o gosto popular ao longo dos anos, sobretudo pelo traquejo adquirido no dia a dia da operação, o que permitiu ajustes e uma melhora da oferta do serviço de transporte. Entre 2015 e 2018, o número de passageiros apresentou um crescimento de 84%, passando de 4,6 milhões de embarques em 2015 para 8,6 milhões no ano passado.

“Hoje uma viagem de ônibus do fim da linha (Pacatuba) até o Centro (Fortaleza) é uma hora e meia no mínimo. Nas horas de pico, pode chegar a duas horas. E o metrô é sempre entre 40 e 42 minutos. A população já reconhece isso. E como o metrô tem reduzido as suas interrupções e dificuldades operacionais, porque está mais sistêmico, com mais disponibilidade e confiabilidade, começou a atrair mais as pessoas para o trem. Até um tempo atrás, reclamavam do metrô. Agora, reclamam do intervalo. É bem interessante isso”, observa Eduardo.

Segundo o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP-Brasil), Fortaleza registrou um crescimento de 11 pontos percentuais, de 2% em 2017 para 13% em 2018, no indicador de proximidade ao transporte de média e alta de capacidade. Também chamado PNT, sigla para o termo original em inglês People Near Transit, o indicador mensura o percentual da população de uma cidade ou região metropolitana que reside em um raio de até um km de estações de sistemas de transporte público de média e alta capacidade.

“Ao oferecer maior diversidade de horários para este sistema, você traz uma série de benefícios aos usuários, principalmente para os mais vulneráveis, como idosos, mulheres e crianças”, observa Beatriz Rodrigues, Coordenadora de Transporte Público do ITDP Brasil.

Para se ter ideia da realidade de outras cidades, em 2018, o índice do Rio de Janeiro foi de 30%, Curitiba 23% e São Paulo 22%. “Todas essas (cidades) apresentam sistemas de média e alta capacidade, como metrô, trem e BRTs de forma mais distribuída em seus territórios, com maior infraestrutura e com horários de funcionamento e frequências mais diversos”, frisa Beatriz. (Isaac de Oliveira)

 

VLT já é opção de transporte para 1,8 milhão

 

O Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) Parangaba-Mucuripe já transportou 1,8 milhão de passageiros desde o início da operação assistida, em junho de 2017. Integrado à Linha Sul do Metrô e localizado ao lado do terminal de integração de ônibus, ambos no bairro Parangaba, o modal é parte importante na estratégia de integração de transportes. Quando finalizado - atualmente estão em funcionamento oito das dez estações do projeto - o VLT Parangaba-Mucuripe terá potencial para atender 90 mil pessoas por dia.

Eloana Alves, 29, mora em Maracanaú e utiliza a Linha do Sul do metrô frequentemente. Quando tem necessidade, recorre ao Ramal Parangaba-Mucuripe, caso seu destino fique próximo de alguma estação do VLT. Na avaliação da gerente de lojas, o modal tem se mostrado seguro e econômico. “Eu acho confortável, apesar dele ser mais lento. Eu pego o metrô até a Parangaba e pego ele (VLT) porque acho mais prático, mais seguro e é de graça”, diz.

A frota desta linha é composta por dois trens, que atendem ao público de segunda-feira a sábado, de 6h às 12 horas e de 16h às 20h30min. Por ser um sistema a diesel, esse transporte é mais lento que o metrô (elétrico). Durante a fase de teste, a velocidade média alcançada é de 30km/h. A finalização do ramal Parangaba-Mucuripe ainda não tem data definida. A Secretaria da Infraestrutura do Ceará (Seinfra) aguarda a resolução de dois processos de desapropriação, que impedem a execução dos serviços na faixa de domínio.

Também operada por VLT, a Linha Oeste tem 19 km de extensão, interligando Fortaleza e Caucaia, na Região Metropolitana. Por dia, aproximadamente 8,5 mil embarques são registrados na via que conta com dez estações. As tarifas custam R$ 1 (inteira) e R$ 0,50 (meia). A frota é composta por três trens, que circulam com velocidade média de 40 km/h. O horário de funcionamento é de segunda-feira a sábado, de 5h30min às 20h40min.

 

Crescimento de passageiros transportados por ano

 

Linha Sul

2015: 4.697.040

2016: 5.496.027

2017: 6.545.032

2018: 8.646.192

2019: 4.654.190 (até junho)

 

Linha Oeste

2015: 1.785.832

2016: 1.883.253

2017: 2.115.351

2018: 2.267.989

2019: 1.105.787 (até junho)

O que esperar do futuro

Com projetos de curto, médio e longo prazo, a Cidade deverá se remodelar, aperfeiçoando e expandindo sistemas já em operação e aderindo a novos modelos

Parte do desafio de se pensar em mobilidade urbana é o de atender demandas pontuais e urgentes, mas sem perder de vista o que se quer e precisa para o futuro. Similar ao contexto de outros grandes centros, Fortaleza cresceu sob uma agenda de desenvolvimento urbano pautada nos automóveis, que, hoje, espremem-se em uma malha viária que, sobremaneira, não tem para onde expandir. A solução para os transportes tem de estar integrada ao planejamento de cidade pretendida. A ideia é que os deslocamentos se tornem cada vez mais facilitados e diversificados, sejam eles individuais, coletivos, tradicionais ou disruptivos.

“Falar de mobilidade urbana sustentável é falar de como os sistemas de transporte precisam estar em constante diálogo entre si e com o entorno. É preciso integrar estratégias e projetos de transporte público com mobilidade a pé, mobilidade por bicicleta, planejamento urbano e gestão de demanda. Fortaleza tem avançado neste sentido, e é preciso manter esta constante integração em diversos níveis e setores, colaborar com um intercâmbio contínuo de práticas entre cidades, continuidade política, base regulatória sólida e gestão financeira transparente”, reflete Beatriz Rodrigues, coordenadora de Transporte Público do ITDP Brasil.

A longo prazo, o Fortaleza 2040 é quem norteia as ações de mobilidade e acessibilidade urbana da Capital, com o foco de tornar a cidade mais conectada, acessível e justa. Com estratégias de curto, médio e longo prazo, o planejamento já tem algumas ações em execução e outras que se conectam, tendo o ano de 2040 como horizonte.

O sistema de transporte idealizado e estudado para Fortaleza, conforme o plano, a fim de suprir as necessidades de deslocamento,é baseado em serviços de transporte público de Bus Rapid Transit (BRT), de metrô e de veículos leves sobre trilhos (VLT). No caso do BRT, há uma série de corredores previstos no cronograma de longo prazo. Para o BRT da avenida Aguanambi, por exemplo, inaugurado no final do ano passado, a proposta é que ele se conecte ao bairro Messejana, por meio da rodovia federal BR-116.

“Isso depende de uma tratativa, que a gente está tocando com o Governo Federal, porque a jurisdição da BR-116 é do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes). Existe a proposta mas isso está sendo conversado ainda”, explica o engenheiro da Prefeitura de Fortaleza, Victor Macêdo. Segundo o engenheiro, o próximo BRT a ser tirado do papel é o da avenida Senador Fernandes Távora.

Na avaliação do professor Mário Azevedo, do Departamento de Engenharia de Transportes (DET) da Universidade Federal do Ceará (UFC), os BRTs são modelos que devem ser seguidos. “É um tipo que implanta relativamente rápido, se comparar com o metrô. É mais barato, não tem uma obra tão grande. Não descarto o ferroviário, ele tem outro papel. Mas aí vai se fazendo conforme tem recurso, e dentro de um planejamento para a cidade”, postula.

Novidade de curto prazo, a gestão municipal planeja disponibilizar, até o final do ano, um projeto-piloto de uma linha de transporte sob demanda, modelo que já é aplicado em cidades como Goiânia e São José dos Campos (SP). A ideia é testar o transporte em uma área específica, através de aplicativo, similar a apps de transporte particular (Uber e 99). Em fase de estudos, a prefeitura estuda alguns detalhes, como tarifação e integração com outros modais.

“Nós acreditamos que é um projeto viável. A ideia é usar carros menores, do tamanho de uma van ou como se fosse um microônibus. Os usuários chamam pelo aplicativo o ônibus, e aí o aplicativo vai dizer: caminhe tantas quadras até o ponto tal, que o ônibus vai passar nesse horário. O usuário bota a origem e o destino, e o veículo vai passando, recolhendo essas pessoas, em função da rota”, explica Victor. (Isaac de Oliveira)

 

Nova linha de metrô deve ser finalizada em 2022

 

A rede metroviária (liga Fortaleza e municípios da RMF) deverá ser expandida nos próximos anos. Contudo, essas são obras complexas que despendem tempo e muitos recursos. Atingir a capacidade projetada é um planejamento de 15 a 20 anos.

“O País passou por muitas crises, e isso implicou numa  descontinuidade da liberação de recursos e da capacidade de investimento tanto da União quanto do Estado nas obras de metrô”, contextualiza Eduardo Hotz, diretor-presidente da Cia Cearense de Transportes Metropolitanos.

Dentro de um projeto de longo prazo, a ideia é que o sistema metroviário atenda uma demanda de 350 mil pessoas por dia. Para isso, é preciso, ao longo dos anos e de forma paulatina, conectar: a linha Sul do metrô, que liga a Capital às cidades de Maracanaú e Pacatuba ; a Linha Leste, que está em obras e ligará o Centro ao Papicu ; O VLT-Parangaba Mucuripe, atualmente em operação assistida;  e Linha Oeste, que liga Caucaia à Fortaleza por meio de VLT (diesel) mas que, sem prazo estabelecido, deverá ser eletrificada.

“Nós temos que terminar o VLT de Parangaba e estar operando comercialmente. Terminar a fase 1 da via Leste. E temos que melhorar as condições de infraestrutura da via Oeste. Tudo isso é um projeto em continuidade, mas só pode ser feito na medida que os orçamentos permitam os investimentos”, acrescenta Eduardo.

A fase 1 da Linha Leste está em obras e deverá ser finalizada até 2022. Com 7,3 km de extensão, essa via contará com uma estação de superfície (Tirol) e outras quatro subterrâneas (Chico da Silva, Colégio Militar, Nunes Valente e Papicu). Quando concluída, poderão ser transportados até 150 mil passageiros por dia. O tempo de viagem estimado entre o Centro e o Papicu será de 15 minutos, e o orçamento total, que conta com investimentos do Governo Federal, do BNDES e do Tesouro Nacional, é de cerca de R$ 1,85 bilhão.

Desafios da mobilidade

É voz geral afirmar melhorias na mobilidade urbana em Fortaleza, facilitando maior acessibilidade.  Entretanto, permanecem os senões e o tempo gasto nos deslocamentos é o item mais reclamado. O tempo é crucial no movimento urbano. Sair de casa cada vez mais cedo e retornar mais tarde para diferentes atividades interfere fortemente na qualidade de vida do cidadão.

Os problemas se acentuam na região metropolitana, ocasionando deslocamentos lentos e demorados.

O Programa Minha Casa Minha Vida expandiu sobremaneira a malha ocupada da franja metropolitana e, ao mesmo tempo, coincidiu com a incidência do programa de governo de redução de impostos para compra de veículos motorizados. Adquirir automóveis ou motos em longas prestações permitiu a compra ou aluguel de imóveis construídos pelo MCMV em áreas mais distantes do núcleo central de Fortaleza, sem a devida infraestrutura de transporte capaz de atender às novas demandas. O aumento do número de veículos em circulação nas áreas de expansão metropolitana resultou em mais congestionamentos nas vias radiais e nas estruturantes, especialmente nos horários de pico.

As deficiências dos transportes públicos na região metropolitana de Fortaleza permanecem. Foi reduzido o impacto do Metrofor e das linhas Centro/Caucaia e Parangaba/Mucuripe do Veículo Leve sobre Trilhos -  VLT nos serviços de transporte metropolitano. O modal ônibus permanece mais competitivo. A grande novidade na mobilidade e acessibilidade urbanas em Fortaleza foi o considerável aumento do número de motoristas de aplicativo que colocaram em circulação milhares de veículos nas ruas da Cidade, provocando tráfego intenso e diferentes reações e conflitos com motoristas de táxi e órgãos de controle urbano. O contexto de crise com elevadas taxas de desemprego explicam a forte adesão de motoristas nessa modalidade de transporte que não para de crescer.

O incentivo ao uso da bicicleta como importante modal de transporte inspira-se em política pública adotada nos países mais avançados, que vêem as pedaladas como programa de saúde,  economia de energia e redução dos níveis de poluição. A Prefeitura de Fortaleza lançou o Programa Bicicletar com a instalação de estações, construção de ciclovias e demarcação de ciclofaixas.  O incentivo ao ciclismo facilita deslocamentos, embora suas estações estejam concentradas no setor nordeste da cidade, que coincide com os bairros onde se encontram as famílias com renda mais alta, que usam a bicicleta como lazer.

A deficiência na mobilidade concentra o movimento urbano revelando diferentes mapas onde a geografia dos deslocamentos revela territórios com diferentes composições de renda. A aglomeração ainda em pleno processo de formação apresentou altas taxas de crescimento ao longo dos resultados censitários de 1960, 1970 e 1980. O planejamento metropolitano ainda ausente, hoje, era ainda mais precário, e a cidade se expandia sem controle com ausência de políticas públicas reguladoras do uso do solo e plano de circulação. Fortaleza, uma metrópole incompleta, impõe severos desafios no plano da mobilidade e da acessibilidade urbanas, limitando a circulação em grande parte de seu território.

 

José Borzacchiello da Silva

Professor Doutor da UFC/PUC-Rio

Movimento Urbano #01

A mobilidade é um assunto que interessa a todos, independente do meio que se use para se locomover.

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