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Aqui é favela

Por Érico Firmo

 

 

O que faz a riqueza de uma cidade? O que é um bom indicador de desenvolvimento? Talvez melhor que olhar para PIB ou renda per capita, observar as áreas mais pobres de um território ofereça medida mais exata do quão avançado é um povo. Por isso, neste aniversário de Fortaleza, O POVO Online fala sobre favelas, com as favelas e a partir das favelas.

Há obviamente muitos problemas nesses lugares e eles estão presentes nestas narrativas. Não dá para ignorá-los e não se quer ignorá-los. Entretanto, a perspectiva aqui adotada é do que, apesar de tudo, se consegue produzir nos locais mais vulneráveis de Fortaleza. Da força criadora que emerge justamente onde há mais obstáculos. As soluções encontradas, os caminhos abertos, a representação da realidade vivida.

São histórias de lugares. Mas, principalmente, de pessoas que vivem e transformam esses espaços. E, claro, da transformação que propiciam. Indivíduos que conseguem influenciar a vida de muito mais gente. Quem sabe, melhorar essas vidas.

Na primeira parte da série de reportagens, o repórter Lucas Braga fala da produção de riqueza propriamente dita. Da economia pulsante e inventiva das favelas. Das alternativas criadas para superar a pobreza e explorar um consumo a partir das necessidades mais primordiais de quem tem pouco para gastar e, por isso, usa o dinheiro com muito critério.

Na segunda reportagem da série, o repórter Rubens Rodrigues mostra a arte, a cultura como meio de representação da realidade e, também, como forma de mudar a própria vida das pessoas envolvidas.

Para fechar este especial, o repórter Igor Cavalcante escreve sobre a organização social e política. Das iniciativas que surgem dos próprios moradores para se articular, superar as dificuldades, interferir nas decisões que afetam suas vidas, pressionar o poder público e transformar a realidade.

De onde vêm as favelas

A denominação favela é carregada de estigmas. A palavra surgiu a partir da planta Jatropha phyllacantha, chamada faveleira ou mandioca-brava. Era comum no monte do sertão baiano que, por isso, ficou conhecido como Morro da Favela. Ali acamparam as tropas enviadas pelo Governo Federal para destruir o Arraial de Canudos.

Terminada a guerra, veteranos tiveram autorização do Ministério da Guerra para construir casas no Morro da Providência. Pela similaridade geográfica e a lembrança do lugar que foi casa por quase um ano, deram o nome favela.

Não deixa de ser irônico, dado o histórico de violência policial, que a primeira favela tenha sido construída e habitada por ex-militares. Egressos da destruição da empreitada popular e messiânica de Canudos.

Nome e lugares são carregados de estigmas. Vergonha, inclusive. Negação, inevitável. "Comunidade" é o eufemismo mais rotineiro. "Periferia" ou "subúrbio" são generalizações, denominações de áreas muito maiores para evitar chamar do nome que é.

Nem toda periferia é favela, nem toda comunidade é favela. E favela precisa ser chamada pelo nome. Se não, é mais uma forma de apagar, silenciar, esconder, fingir que não existe.

Fortaleza é tomada de favelas. Invisíveis que por vezes sejam, são 509 "aglomerados subnormais", conforme a designação dada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Censo 2010.

Por isso o título-afirmação deste texto: "Aqui é favela", nas palavras de Alécio "D'Leste" Fernandes, fundador do coletivo de cultura Natora, do Pirambu, para o jornalista Rubens Rodrigues.

Há aí orgulho, autoestima, reconhecimento e auto-reconhecimento. Sobretudo, a negação de qualquer coisa que signifique rejeitar a evidência da presença desses territórios sem os quais é impossível definir a Cidade.