O varejo que inova

O varejo que inova se traduz em enfrentar as rotas econômicas com entusiamo e criatividade. Conquistar o cliente e mantê-lo em primeiro lugar é o embarque para o sucesso do negócio

Por Irna Cavalcante

Joana Ramalho, dos Mercadinhos São Luiz, diz que é importante entender o cliente (Foto: Aurélio Alves/Especial para O POVO)
 

O varejo se prepara para alçar voos, após dois anos consecutivos de queda. A taxa básica de juros (Selic) caiu, neste mês, de 8,25% para 7,5% ao ano, o nível de endividamento do consumidor já é menor ante 2016 e um novo horizonte de oportunidades surge em Fortaleza a partir da aprovação de leis como a que flexibiliza o horário de funcionamento do comércio - antigo pleito do setor.

No decolar de investimentos como o da concessionária alemã Fraport no Aeroporto de Fortaleza e o hub (centro de conexão de voos) da Air France-KLM/Gol, a Capital será ponto de check-in de consumidores do mundo inteiro.

Mas o momento inspira cautela. O varejo cearense ainda está se abastecendo  - é momento de recuperação. De acordo com a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), realizada pelo IBGE, enquanto o volume de vendas no Brasil, de janeiro a agosto de 2017, acumulou alta de 0,7% em relação a igual período do ano anterior, o Estado ainda apresenta recuo de 3,8%. Os números mostram, no entanto, que a direção do manche é para um cenário não tão ruim como era em 2016, quando a queda chegou a 6,7%.

“A avaliação que a gente faz deste momento é positiva, porém, com muito pé no chão. Ainda temos um número significativo de desempregados. Mas os indicadores econômicos apontam para melhora. E aquele indicador da lojinha lá do Centro é que, diante o ânimo do cliente, teremos um bom fim de ano”, avalia Severino Ramalho Neto, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Fortaleza.

Para ter êxito, no entanto, é preciso estar atento às mudanças de prumo do perfil de consumo. O cliente está com menos dinheiro no bolso para ir às compras, porém, mais consciente em relação aos gastos, conectado. O que exige do lojista boa equação das operações e conhecimento.

Se os desafios são grandes, a força de vontade dos comerciantes é faz a crise sair da pista de pouso. Entre as empresas que estão conseguindo bons resultados, traço comum é o investimento em inovação. Seja na hora de reestruturar processos, pessoas, enxergar novos nichos ou novas formas de chegar até o consumidor. E é esta capacidade de se reinventar para fazer a diferença que pode tornar o varejo mais forte quando a economia voltar a crescer de forma mais sólida.

“O setor ainda tem uma jornada longa para trilhar, mas quem está mais aberto a mudar de atitude, investir em inovação, com certeza, chega mais forte quando economia ganhar força”, afirma o consultor da Being Marketing, Bosco Couto.

É hora de surpreender

Parceria entre Lenita e Tallis Joias incrementam as vendas (Foto: Aurélio Alves/Especial para O POVO)
 

Foi-se a época em que atender no Instagram era uma inovação. Hoje, todo mundo faz. É preciso que os diversos formatos de relacionamento com o consumidor funcionem de forma eficiente e com criatividade. É hora de surpreender.

A estratégia de integração da experiência de compra entre diversos canais, o chamado omnichannel, é exemplo do futuro do varejo e seu grande desafio. Um cliente pode se relacionar com a marca, por exemplo, pelo Facebook, experimentar o produto em uma loja física, comprar pelo mobile e retirar em outro local. Ou fazer o caminho inverso para solucionar um problema. Portanto, Bruno Leitão, professor da Faculdade CDL, diz que é “necessário se adaptar”.

E a empresa que tem omnichannel forte retém 89% dos clientes. São bem mais do que os 33% retidos por empresas que não investem o suficiente neste tipo de estratégia, segundo estudo do Aberdeen, grupo norte-americano especializado em pesquisas de mercado. “Você inova, mas o passo seguinte é consolidar os processos”, afirma Carlos Ramos, CEO da Simplix Consultoria.

 

Parceria de peso

Contar com a mão parceira para crescer também é estratégia no varejo. A empresária Maria Lúcia Negrão, dona da loja de roupas Lenita, se uniu na última semana com a Talyzie Mihaliuc, da Tallis Joias, para trazer uma terceira convidada de peso: a grife italiana de bolsas Prada, que não tem loja em Fortaleza, para um evento reunindo clientes das três marcas.

Não se trata de fusão ou de uma nova marca surgindo no mercado. A fórmula é bem mais simples: uma loja, no caso a da Lenita, cedeu seu espaço físico para que as outras duas também apresentassem seus produtos.

“É um produto que não é nosso, mas a Prada é uma marca internacional que, assim como a Tallis Joias, tem uma relação muito próxima com o nosso produto, agrega. Há uma troca de mailing e também uma oportunidade de estreitar o relacionamento”, explica Maria Lúcia.

O ambiente favorável a novas experiências de compra tem possibilitado à marca, com 30 anos no mercado, crescer mesmo em cenário adverso da economia. “Para driblar a crise que, logicamente, atinge o nosso mercado diretamente, porque vendemos supérfluo, é preciso, antes de tudo, despertar nas pessoas o desejo de consumir”.

A advogada Jeritza Gurgel, 42 anos, gostou da experiência. “A parceria é muito interessante porque facilita a vida do consumidor. Eu posso ir à loja de roupas e já olhar um sapato, uma bolsa, uma joia de uma marca que eu também gosto, no mesmo lugar”.

Para que a estratégia desse certo, foi preciso fazer o dever de casa: rever processos, reduzir margem de lucro, criar mais facilidade de pagamento e estar pronto para falar a língua do novo consumidor. Talyzie conta que, desde o ano passado, as ações da marca vêm sendo pautadas mais fortemente na integração das lojas físicas às redes sociais e ao delivery. “A gente marca com uma boa experiência. Quando a crise passar, aquele cliente continua sendo meu cliente, não se acostumou a comprar em outro lugar. Eu retive os meus e ainda conquistei outros”.

Irna Cavalcante

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Criatividade em processos

O empresário Deda Gomes capacita sua equipe para ter excelência no atendimento ao cliente (Foto: Mateus Dantas)
 

Os processos internos, sejam de logística ou de gestão de pessoas, estão no topo da prateleira como importantes para a composição dos preços de produtos e para o bom resultado de uma empresa. Modernizar estes dois importantes segmentos passa pela etapa de rever processos para chegar à eficiência e com criatividade.

Na esteira das estratégias, o Pinheiro Supermercado opta pelo compartilhamento de logística, chegando ao fim do mês com dinheiro a mais no caixa. Desde janeiro, passou a fazer, em parceria com a indústria Betânia, a operação back home. O caminhão sai do centro de distribuição do Pinheiro, em Fortaleza, para levar mercadorias para as lojas da rede em Juazeiro do Norte. Na volta, passa pela fábrica da Betânia, em Morada Nova, e já traz a carga que estava prevista para ser entregue na Capital. Compartilhando custos e evitando, assim, a subutilização da frota.

“Antes, este caminhão voltava vazio e era um custo a mais que a gente tinha”, explica o diretor administrativo do Pinheiro Supermercado, Tadeu Pinheiro. O resultado é uma economia de mais de R$ 100 mil ao ano, além dos ganhos ambientais com 192 caminhões a menos circulando.

Mais tech

A tecnologia é também uma aliada. Há dois meses, a rede de supermercados passou a inserir no código de barras a data de validade do produto. Assim, quando um cliente tira a mercadoria do carrinho, se o produto estiver vencido, o sistema no caixa impede a venda. A inovação traz segurança ao consumidor e ajuda a empresa a identificar seus gargalos de operação.

Na Normatel, um software ajuda na organização do layout do centro de distribuição para que os produtos que vendem mais fiquem nas linhas mais próximas das áreas de carregamento. A equipe de produção passou a ser valorizada pela produtividade. Em menos de três meses, a empresa conseguiu reduzir de 72 para 48 horas o tempo de entrega ao cliente. “E pretendemos chegar a 24 horas”, afirmou o gerente de logística, Alexandre Gualberto.

Eficiência

Em comum, as empresas são associadas ao ECR Nordeste (Resposta Eficiente ao Consumidor). O próprio grupo, formado por indústrias, atacadistas e varejistas, é prova de que o mercado está buscando se reinventar. Criado em 2015, a entidade busca soluções para processos, redução de custos comuns, aumento da eficiência e melhora do atendimento. “A melhor forma de sair de um momento de crise é a eficiência”, diz o coordenador do ECR Nordeste, Simone Ciocollani.

Ele explica que a parceria com fornecedores e mesmo entre pares é tendência para obter produtos competitivos.  “No Brasil, isso ainda é feito de forma muito emocional. O discurso é cortar pessoas e custos. Mas não é a melhor”.  Simone defende que é preciso medir eficiência e produtividade para depois decidir ações de melhoria. “É algo que deve ser muito bem calculado, engenheirizado, para não afetar a qualidade do serviço”, acrescenta.

Um robô para chamar de seu

Marlos Távora, 34, criou, no ano passado, a Chatbotmaker, startup que oferece para outras empresas soluções de chatboots (Foto: Aurélio Alves/Especial para O POVO)
 

Se a integração dos canais de atendimento ao cliente  ainda é um peleja para muitos varejistas, em Fortaleza, já tem empreendedores mirando em oferecer a solução. O jovem Marlos Távora, 34, é um deles. Ele criou, no ano passado, a Chatbotmaker, startup que oferece para outras empresas soluções de chatboots (espécie de robôs capazes de conversar por texto com humanos). Hoje, já são dez empresas atendidas no Estado e uma plataforma de mais de um milhão de usuários.

Na prática, este tipo de tecnologia permite que o varejista possa aprimorar as vendas por meio das plataformas digitais, além de engajar clientes e aumentar a interação com a marca. No Brasil, é o que fez o Magazine Luiza, com a assistente virtual Luiza.

No Ceará, empresas como  Grupo de Comunicação O POVO e a Meu Óculos de Madeira já utilizam estes recursos. “A gente oferece ferramentas de automação no Facebook. Se a empresa quer se diferenciar no mercado, tem sempre que pensar em inovação”, afirmou. Para o consultor de varejo, Pedro Santos, o fortalecimento do e-commerce  é a aposta do varejo. “As empresas precisam estar preparadas para integrar todas as ferramentas”, destaca.

Bom atendimento é a alma do negócio

Há dois meses, o grupo Geppos decidiu diversificar o mix de negócios e abriu uma franquia da loja de vinhos argentinos Grand Cru. Além de uma cartela variada, uma das especialidades da Casa é a busca pela excelência
no atendimento.

O diretor da Grand Cru, Deda Gomes, explica que um dos diferenciais da loja é promover, dentre outras experiências de compra, confrarias de vinhos para que os clientes degustem, conheçam melhor as propriedades e a história dos produtos. Para isso, além de um sommelier, é preciso toda uma equipe capacitada.

E é aí que entra a inovação. Nos treinamentos, além de orientações sobre atendimento, sobre produtos, os garçons, chamados de consultores gastronômicos, também fazem degustação dos pratos e bebidas servidos na Casa. “Se ele conhece, tem mais segurança e propriedade para oferecer o produto ao cliente. Com algumas perguntas, já será capaz de entender o desejo do cliente e sugerir qual o tipo de vinho harmoniza melhor com o prato e a ocasião”, explica.

Para o sócio-diretor da consultoria Being Marketing, Bosco Couto, oferecer um bom atendimento é fundamental para converter a venda. “Tratar bem o cliente parece coisa simples, mas não é. Conhecer o produto e entender a lógica de cada cliente é o que faz a diferença”.

É o que também pode ser decisivo entre uma compra on ou offline. Basta lembrar que, mesmo sem sair de casa, é possível comparar preços e encontrá-los, em geral, até menores do que em uma loja física.

“Cada vez mais, o consumidor está em busca da experiência de compra. São cerca de 68% da população que saem de casa com a loja que quer comprar na cabeça, mas quando chega na frente de outras, o atendimento muda a intenção de compra”, diz o presidente da Ação Novo Centro e presidente eleito da CDL Fortaleza, Assis Cavalcante. 

Irna Cavalcante

 

Mais flexibilidade para funcionar

Comércio deve aproveitar datas especiais, como feriados, para ampliar horários e elevar vendas com atração de clientes às lojas (Foto: Aurélio Alves/Especial para O POVO)
 

A lei do Comércio 24 horas abre nova perspectiva para o Varejo. A projeção das lideranças do setor é a de que a mudança pode gradativamente impulsionar o consumo, gerar empregos e trazer para Cidade novos hábitos de compra.

Não será do dia para noite que as lojas vão funcionar 24 horas, apesar de a lei permitir. Tão pouco é o que os empresários querem em função do alto custo deste tipo de operação. Mas a ideia é que, conforme a demanda for se consolidando, as lojas fiquem abertas por mais tempo. Inicialmente, nos feriados e datas comemorativas. “O que a gente quer é a liberdade para trabalhar”, diz o presidente da CDL Fortaleza, Severino Ramalho Neto.

Com o tempo vão surgir novos hábitos de compra, a exemplo do que ocorreu nos shoppings aos domingos, que apesar da pouca adesão no início, hoje, já é o segundo dia de maior movimento.

A flexibilização é tida como essencial pelo presidente da  Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Ceará (FCDL-CE), Freitas Cordeiro, até mesmo por conta da demanda que vai surgir a partir do hub aéreo da Air France-KLM/Gol. “Em uma cidade turística, o comércio não pode fechar às 18 horas”. Assis Cavalcante, presidente da Ação Novo Centro, destaca que, para a mudança dar certo, é preciso também reforçar a segurança, o transporte público e a cultura.

SAIBA MAIS

O que diz a lei:
Estabelecimentos localizados nas Zonas Especiais de Dinamização Urbanística e Socioeconômica (Zedus), como Centro e Praia de Iracema; aqueles distantes em até um quilômetro da orla marítima; e supermercados poderão funcionar 24 horas por dia, de segunda a domingo.

Já shopping e lojas de rua que estiverem a 1 km de distância do shopping terão permissão para abrir as portas de 8 horas à meia-noite.

Os demais podem funcionar de 8 às 19 horas de segunda a sexta-feira, e de 8 às 16 horas aos sábados. A extensão deste horário e o funcionamento aos domingos e feriados poderão ser autorizados por meio de decreto do prefeito.

Dentro do Programa Fortaleza Competitiva, da Prefeitura de Fortaleza, estão previstas mais de 50 ações de estímulo à inovação e à criação de novos negócios e oportunidades.

Bate-pronto com o prefeito Roberto Cláudio

Prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, diz que lei do comércio tem potencial para alavancar o varejo da Capital (Foto: Fco Fontenele)
 

A nova lei do Comércio 24 horas sancionada na última sexta-feira, 27, pelo prefeito Roberto Cláudio, tem potencial de impactar no médio e longo prazo, de forma significativa, a configuração do comércio como a gente conhece hoje. Dentre outras regras, os estabelecimentos que estiverem localizados nos shopping centers e no entorno de um quilômetro poderão funcionar das 8h à meia noite e os estabelecimentos que estejam distantes em até um quilômetro da orla marítima e situados nas Zonas Especiais de Dinamização Urbanística e Socioeconômica (Zedus), como o Centro, poderão funcionar 24 horas por dia. A adesão aos novos horários é uma faculdade do lojista. Em entrevista por email, o prefeito Roberto Cláudio falar sobre o projeto e o que está sendo estruturado para estimular o Varejo.

OPOVO - Por que estender o horário de funcionamento do Comércio?

Prefeito Roberto Cláudio - A Prefeitura considera que, ao adotar essa medida, vai estar acionando duas premissas importantes. A primeira delas é a possibilidade concreta de aumentar o número de empregos e de renda para os comerciários, num momento de crise na geração de postos de trabalho em todo o País. A segunda é a requalificação de áreas específicas de Fortaleza, como o Centro da nossa Capital e os bairros com maior vulnerabilidade social.

OP -  Qual o potencial da mudança para a economia da Cidade?

RC - O resultado esperado com o Programa Fortaleza Competitiva é um impacto direto e indireto na economia no âmbito de R$ 2 bilhões no PIB, incluindo, a geração de empregos e o estímulo aos novos negócios em regiões mais vulneráveis da cidade.

OP – O estudo traçou estimativa de quantos empregos serão gerados?

RC - Entendemos que o poder público tem obrigação de criar condições objetivas e uma ambiência favorável para permitir o surgimento de novos negócios e novas vagas de emprego, entretanto os resultados vão depender de diversas variáveis, inclusive dos investimentos que deverão ser feitos pelo setor privado. Mas uma coisa é certa: a ambiência para geração de novos postos de trabalho está sendo criada.

OP - Dentre as questões que vem sendo apontadas pelo sindicato dos comerciários como um problema para ampliação do horário diz respeito à questão da segurança e transporte público. Há alguma medida da Prefeitura neste sentido?

RC - A Prefeitura já vem estudando medidas para melhorar cada vez mais o transporte público na Capital, inclusive ampliando os horários e as linhas para novas regiões com potencial para o comércio.

OP - Quais outras medidas estão previstas dentro do Fortaleza Competitiva para estimular o varejo?

RC - O programa Fortaleza Competitiva reúne um conjunto com mais de 50 ações de estímulo à inovação e à criação de novos negócios e oportunidades. Por meio do Programa, além do horário do comércio, teremos ações como os arranjos público-privados, a desburocratização cada vez maior dos processos para a abertura de novos negócios, a desoneração tributária e, muito fortemente, a capacitação para a inserção no mercado de trabalho, gerando oportunidades reais inclusive para os jovens que estão em busca do primeiro emprego.

Irna Cavalcante

O cliente em primeiro lugar

Entender e acompanhar as mudanças de hábito do consumidor são essenciais para direcionar o rumo a seguir no varejo. E se engana quem pensa que o consumidor vai estar em busca apenas do menor preço. O custo-benefício continua sendo preponderante.

Dados do estudo Crescimento do Varejo, da consultoria Nielsen, mostra que, mesmo na crise, dos cinco fatores que mais influenciam a decisão de compra em uma loja, três estão relacionados ao sortimento: alta qualidade dos produtos frescos, produtos regularmente em estoque e possuir os itens que o cliente necessita. “O empresário tem de conhecer e saber ouvir os anseios do seu cliente. É ele quem manda”, explica o consultor de varejo, Paulo Maranhão.

Neste ponto é fazer o que o seu Manoel da vendinha já fazia, explica Severino Ramalho Neto, presidente da CDL Fortaleza. “O seu Manoel conhece os clientes pelo nome, sabe o que ele consome, quantos filhos tinha. A fórmula é exatamente a mesma, as ferramentas é que são diferentes”.

E hoje o comerciante tem tecnologia suficiente para conhecer melhor o seu cliente. Porém, não é uma tarefa fácil, já que esta mesma ferramenta também está à disposição do consumidor, o que faz com ele busque se tornar único. Outra regra de ouro é saber dar atenção na hora da venda, mas também não negligenciar eventuais “dores” do cliente.

O superintendente do shopping RioMar Fortaleza, Gian Franco, diz que o aprimoramento da hospitalidade deve ser um trabalho constante. Por mês, são mais 4,5 mil assistências no Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC), entre empréstimo de itens, informações, achados e perdidos e guarda volumes. Mais recentemente, também foi incluída a opção de empréstimo de carregadores móveis de celular. “Isso para evitar que o consumidor tenha de ficar parado no local enquanto carrega”, destaca.

Bom para cachorro
Na casa da estudante de arquitetura, Amanda Morais, 23, a pequena shitzu, Julie, tem vida de rainha. Com direito a festa de aniversário e até mesmo armário próprio para guardar tamanha quantidade de roupas, brinquedos e adereços. É também em função dela que muitos dos passeios da dona são programados. “Para mim, ela é como uma filha. Eu já deixei de ir para vários lugares porque não aceitavam pets e mesmo quando tenho com quem deixá-la, prefiro levá-la comigo”, observa.

Pesquisa realizada neste ano pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), em todas as capitais, com internautas que possuem ou são responsáveis financeiros por um animal de estimação, revela que comportamentos como os da Amanda são cada vez mais comuns no Brasil. Para 61% dos entrevistados, os pets são como membros da família.

Não à toa, este é um mercado em ascensão. O Brasil já é o terceiro maior consumidor de produtos pet no mundo. Perde apenas para os Estados Unidos e Reino Unido, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet).

A robustez do segmento tem levado muitos empreendimentos a reverem seu posicionamento em relação à entrada de animais. O shopping Iguatemi, por exemplo, decidiu em agosto liberar os pets no local, sendo o primeiro do Estado a permitir que circulem mesmo sem estar no carrinho ou com focinheiras.
Há algumas restrições de espaços e de raças permitidas. Cada loja também fica livre para decidir se aceita ou não a entrada de animais, mas muitas já estão disponibilizando, inclusive, bebedouros e petiscos para cativar os novos visitantes e, claro, agradar seus donos. “O retorno tem sido muito positivo, principalmente, nas redes sociais. Nos fins de semana, chegamos a ter de 50 a 60 pets no mall. São clientes que talvez não viessem se não tivessem o pet ao lado”, afirmou o superintendente do shopping, Wellington Oliveira.

Para Amanda, o provérbio “quem meu filho beija, minha boca adoça” faz todo sentido. “Às vezes, nem saio com a intenção de comprar nada, mas só de tratar bem o pet, acabo entrando na loja e levando alguma coisa”.

O QUE ATRAI

ALTA QUALIDADE DE PRODUTOS FRESCOS

57%

LOCALIZAÇÃO CONVENIENTE

56%

PRODUTOS REGULARMENTE EM ESTOQUE

54%

BOM CUSTO-BENEFÍCIO

52%

POSSUI OS ITENS QUE PRECISO

50%

FONTE: NIELSEN - ESTUDO CRESCIMENTO DO VAREJO

O gatilho certo para entender o consumo

Os anseios do consumidor nem sempre vão estar demonstrados de forma clara. A diretora de Estratégia e Inovação dos Mercadinhos São Luiz, Joana Ramalho, explica que o programa Costume Saudável é um exemplo. Há cinco anos, este era apenas o nome de uma seção de produtos da linha diet e light, que foi reorganizada para facilitar o acesso para o consumidor.

“Isso funcionou muito bem até a evolução do mercado, que passou a oferecer mais possibilidades. Mas percebemos que o cliente começou a não entender mais o que era aquilo. Ele ouvia falar e até pegava produtos sem glúten, sem lactose, mas não entendia muito bem o que mudava na vida dele”.

O supermercado passou, então, a disponibilizar informações sobre os produtos. A ideia cresceu e se tornou um grande evento, fomentado por atividades realizadas ao longo do ano com a temática saúde, que oferece desde palestras nutricionais, atividades físicas e dicas de culinária saudável. “A gente entendeu que a solução, e o compromisso com a nossa missão não era só fazer a logística do produto, tinha de ensinar este cliente, mostrar para ele todas as informações disponíveis no mercado para que ele pudesse fazer a sua tomada de decisão e uma compra consciente”, diz.

O investimento se traduziu em números. Hoje, produtos frescos como frutas, verduras e as linhas consideradas fit estão entre os que mais crescem na cesta de compras - e também na fidelização e mudança de hábito da clientela.

A contadora Luciana Torres, 34, diz que sempre procurou ter uma alimentação equilibrada, mas  passou a se interessar mais sobre o assunto. “Também comecei a me exercitar, o que eu não fazia antes”, afirma.

 

Irna Cavalcante

Varejo que faz a diferença

Especial sobre varejo no Ceará: inovar para crescer