Bem-Estar

Para diferentes idades e realidades, a prática do Mindfulness está se expandindo pelo mundo, com um número cada vez maior de adeptos que são atraídos pelos inúmeros benefícios que podem ser alcançados

Por Sabryna Esmeraldo

Durante o IV International Meeting on Mindfulness e o IV Encontro Brasileiro de Mindfulness, em São Paulo, em junho, ficou clara a contribuição de pesquisas, já premiadas, sobre a relação da prática de técnicas de mindfulness com pontos como: melhora na qualidade de vida, ansiedade e depressão em mulheres vítimas de violência sexual; combate à dependência de hipnóticos em tratamento para insônia; e diminuição do estresse em estudantes do ensino superior. Os efeitos da prática seguem sendo estudados e a técnica de meditação ganha o mundo. Os adeptos só crescem. Famosos como a apresentadora americana Oprah Winfrey e o medalhista olímpico brasileiro Diego Hypólito estão inseridos nesse novo universo.

Entre os benefícios alcançados pelo mindfulness, os praticantes destacam a redução de estresse e ansiedade e o aumento do foco nas atividades do dia a dia, com uma melhora significativa da qualidade de vida. Ciente das vantagens que tais benefícios poderiam trazer para a produtividade no trabalho, o mundo corporativo também abraçou a meditação. Um exemplo é o Search Inside Yourself (SYI), centro criado pelo Google com programas que usam a meditação nesse contexto. Mas afinal, o que é Mindfulness?

A ideia de mindfulness

"Mindfulness é a simplicidade em si mesmo. Trata-se de parar e estar presente. Isso é tudo." A afirmação é de Jon Kabat-Zinn, fundador e diretor da Stress Reduction Clinic, no Centro Médico da Universidade do Massachusetts - onde também é professor associado no Departamento de Medicina Preventiva  Comportamental - e um dos pioneiros no desenvolvimento de pesquisas experimentais com mindfulness. Mas para entender mais ainda esse universo é importante destacar: mindfulness é uma coisa, meditação mindfulness é outra.

Conforme informações do Centro Cearense de Mindfulness, em atividade no Estado desde 2014, o termo mindfulness pode designar um traço psicológico (tendência inata de se estar plenamente atento, relacionado a características genéticas e experiências de vida), um estado mental (estado de plena atenção transitório, induzido por vários tipos de atividades, que pode se tornar um traço a longo prazo), um conceito psicológico ou um conjunto de técnicas ou exercícios mentais (meditação mindfulness).

Um exemplo: Você está em uma loja e, no momento de pagar, o responsável por seu atendimento demonstra impaciência e falta de educação. Primeira reação possível: você reage instintivamente, sentindo-se chateado com a situação, deixando a raiva guiar sua resposta ao atendente, provavelmente tratando-o com a mesma grosseria recebida. Talvez a situação, inclusive, leve-o a pensar em como o dia está sendo ruim ou em outras situações similares pelas quais já passou (passado) e em como isso vai deixá-lo cansado e chateado para o restante da semana (futuro).

Segundo quadro: Você já conhece e já tem domínio de técnicas que podem ajudá-lo a atingir um estado mindfulness. Logo, você para e pensa, para ter consciência do sentimento que está tendo naquele momento e da forma como esse sentimento pode afetar seu estado emocional e físico. Com a empatia trabalhada, pensa que aquele atendente pode estar passando por algum problema e reage, apenas após ter atenção plena e capacidade de análise no momento presente, sem negligenciar o problema, mas com uma reação talvez mais benéfica para ambos os envolvidos na situação. Talvez se dirigindo ao atendente com o questionamento: "Você está sendo grosseiro desnecessariamente. Está tudo bem com você?".

O exemplo foi dado por Athila Campos, diretor do Centro Cearense de Mindfulness e presidente do Instituto de Pesquisa e Ensino em Mindfulness e Neurociências (IMIND). A situação hipotética demonstra alguns dos inúmeros benefícios que a prática mindfulness pode nos proporcionar a partir dessa "presença no presente", sem projetar aflições passadas ou futuras. Mas e para quem não tem ainda esse domínio mental e emocional, como se trabalhar para alcançar essa habilidade mindulness no dia a dia? Por meio da meditação mindfulness.

Meditação mindfulness

O conjunto de técnicas que compõem a meditação mindfulness (traduzido aproximadamente como "atenção plena") tem como proposta aprimorar a consciência e o foco no momento presente. Em estudos científicos e na prática clínica, mindfulness tem como uma de suas definições "prestar atenção de maneira particular, intencionalmente no momento presente, sem julgamento, com abertura e curiosidade" (Jon Kabat-Zinn).

Sem vínculo com nenhuma filosofia ou religião específica, a meditação pode ser praticada por qualquer pessoa e envolve desde exercícios que exigem espaço e tempo a atividades que podem ser praticadas na rotina diária, em casa, durante alguns minutos. As chamadas práticas formais podem ser feitas com a pessoa deitada ou sentada em uma cadeira normal ou de meditação, de acordo com o que for melhor para a postura do praticante, que deve estar com coluna reta e pescoço alinhado, para não bloquear a respiração. Mas a meditação se estende para atividades cotidianas.

"Você pode transformar sua hora na academia em um momento de atenção plena, contanto que esteja em contato com as sensações do seu corpo. As pessoas vêm para desenvolver essa habilidade de concentração que todos nós já temos. Começou-se a estudar se a redução dessa capacidade na mente desatenta gera muitos problemas", afirma Campos, que também é instrutor de mindfulness, formado pelo centro Mente Aberta, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e doutorando em Saúde Coletiva pela mesma instituição.

No Centro Cearense de Mindfulness, o curso de Meditação Mindfulness tem oito semanas, durante as quais são trabalhados exercícios diversos para alcançar controle atencional, consciência corporal e autorregulação da emoção. Conforme detalha o professor, o curso é organizado da seguinte forma: semanas 1, 2 e 3 são voltadas para o desenvolvimento da consciência corporal e do controle da atenção – trabalhando sensações corporais, respiração – e desenvolvimento do controle atencional, com exercícios de atenção no ato de caminhar e alongamentos conscientes. Nas 4ª e 5ª semanas, as aulas focam no autocontrole emocional ou percepção das emoções intrapessoais, enquanto a 6ª volta-se para esse controle emocional voltado para o outro (empatia). Na 7ª, é hora de entender como transferir todo esse processo para o mundo. Já na 8ª, dedica-se a construir o cronograma pessoal, de acordo com as atividades com que cada um teve mais afinidade.

Dominando as técnicas

Atualmente, o Centro Cearense de Mindfulness oferece programas baseados no protocolo universal Mindfulness Based Stressar Reduction (MBSR) - Redução de estresse baseada na atenção plena, em tradução livre. "Trabalhamos com técnicas meditativas normais, que chamamos de técnicas do desenvolvimento da atenção e da concentração. Mas há técnicas de mindfulness do avaliativo, 'Onde eu estou agora?', 'Para onde vou?' e 'O que tenho que fazer'. São formas de trazer sua mente para o momento presente. E existem as meditações mais construtivistas, como as que falam de autocompaixão”, explica Campos.

De acordo com o diretor, a meditação é feita de várias formas. Uma das famosas técnicas é perceber a planta dos pés, parar e perceber a pressão que o corpo faz em partes variadas. Outra se caracteriza por prestar atenção à própria respiração. "Dentro do protocolo, têm as técnicas de meditação mindfulness, que são as formais, você precisa parar, sentar, ter um espaço, precisa encontrar estratégias para que não te incomodem e precisa separar um tempo para exercitar aquilo. E têm as técnicas informais, cuja proposta é levar esse conceito para seu dia a dia, seu trabalho, ao tomar banho, ao lavar pratos, ao se alimentar, as atividades rotineiras", explica.

O programa propõe 20 minutos de meditação por dia, que podem ser divididos, por exemplo, em duas séries de dez minutos. O importante é ter a disciplina da prática diária. Segundo a jornalista e terapeuta Mirna Grzich, referência em meditação, depois de 21 dias de prática diária, já podemos sentir os benefícios. "Depois de oito semanas, o próprio cérebro, com sua neuroplasticidade, começa a mostrar efeitos reais, físicos, de transformações, que alteram nosso comportamento, nas sinapses, no corpo caloso, nas glândulas. Nos tornamos mais corajosos, mais compassivos, mais amorosos", destaca a terapeuta.

No corpo e na mente

Para entendermos melhor como as emoções do dia a dia podem afetar nossa saúde física, é preciso relembrarmos um pouco o que classificamos como sistemas autônomos. No estudo da biologia humana, convencionou-se chamar de sistema autônomo todos aqueles que funcionem naturalmente, sem que dependam de nossa vontade, como os sistemas digestivo, circulatório e respiratório. O tecido muscular, em contrapartida, depende de nossa iniciativa para se movimentar.

"O grande problema é que reagimos a situações e eventos com nossa percepção e emoção, que atuam diretamente no sistema límbico, ligado ao autônomo", explica Mirna Grzich. Por isso, emoções e estresses diários refletem diretamente em problemas cardíacos, digestivos, pulmonares. "Tudo ativado pelas emoções. Pela nossa maneira de ver o mundo e reagir a ele", aponta a terapeuta.

Conforme Mirna destaca, várias instituições de medicina – como a Universidade de Harvard e o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, e o Hospital Israelita Albert Einstein, no Brasil – têm estudado e comprovado o efeito da meditação mindfulness em doenças provocadas por ansiedade e estresse, cada vez mais comuns na contemporaneidade. "A meditação mindfulness têm ajudado a reduzir a insônia, tem tratado da síndrome de pânico, tem solucionado doenças que aparecem como 'respostas' do organismo às pressões do dia a dia", explica.

Estado de atenção, foco, sensação de presença, vivacidade e alegria estão entre os benefícios alcançados por meio da meditação. "A meditação mindfulness, ou qualquer tipo de meditação, nos devolve o controle desses sentimentos e emoções, e nos tornamos mais tranquilos, com a inteligência emocional para aceitar as contingências da vida, inevitáveis", afirma a terapeuta.

Atenção plena no dia a dia

Aos 50 anos e mãe de dois adolescentes, a publicitária Mônica Guedes Broseghini sempre gostou de terapias alternativas relacionadas a bem-estar, como forma de desacelerar a mente, em meio às atividades de seu dia a dia. Meditação, entretanto, sempre foi algo difícil para ela. "A palavra 'meditação' significava, para mim, algo impossível. Achava que meditar era algo próximo a esvaziar a mente", conta.

Em 2016, porém, Mônica ouviu falar em mindfulness e resolveu dar mais uma chance à meditação. "Experimentei, por meio de um áudio, uma meditação guiada, e, para minha surpresa, uma das instruções era simples e clara: observar seus pensamentos como se fossem balões sobrevoando, sem se criticar por estar cheia deles. É assim que a mente funciona, num ir e vir de pensamentos. Basta observar o que está acontecendo minuto a minuto", relembra.

Em um passo seguinte, a publicitária comprou o livro "Atenção Plena - Mindfulness - Como encontrar paz em um mundo frenético", de Marc Williams e Danny Penman, que traz a proposta de treinar os exercícios por oito semanas. Os efeitos já foram sentidos com alguns dias. "Estava muito mais disposta e com a mente mais alerta. Percebi que a Atenção Plena é um exercício de auto-observação. E o fato de parar por dez minutos e se perceber, mesmo que hajam muitos 'balões', já nos faz entrar em contato com o momento presente, sem dar asas aos pensamentos e ações no ritmo acelerado do piloto automático. Esse agir sem pensar é o que de fato nos distancia da nossa essência e nos rouba energia de viver."

Há cerca de um ano e meio, Mônica pratica a meditação mindfulness pelo menos três vezes por semana. "Quando estou focada em realizar uma rotina matinal por um tempo pré-estabelecido, consigo facilmente meditar diariamente pela manhã, antes do café da manhã, e à noite. Gosto das meditações guiadas de 10 até 20 minutos no máximo. São muito agradáveis e possíveis de fazer", detalha. Para a publicitária, funciona como uma oração, e a sensação de leveza é indiscutível. "Quando não pratico, sinto muita falta."

E os benefícios físicos da prática também foram sentidos pela adepta da meditação. "Sou super ansiosa com cara de zen. Tinha pensamentos a mil por hora e, hoje, se eu permitir, essa avalanche de pensamentos volta e causa tensão, estresse, dores de cabeça diárias e até enxaquecas. A meditação freia esses pensamentos", explica. Para ela, a Atenção Plena a ajuda a dar um "reboot" diário em sua mente. "Consigo raciocinar melhor e ser mais consciente nas minhas escolhas. Isso muda tudo. Recomendo fortemente para qualquer pessoa em qualquer idade."

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