Bendito seja o fruto

A série de ficção que traz duras realidades sobre a nossa sociedade volta para sua segunda temporada

Por Lyla Pires

The Handsmaid's Tale, série lançada pela plataforma Hulu em 2017 chega à sua segunda temporada com um enredo ainda mais denso e crítico. A série, que apesar de ser uma distopia e retratar uma sociedade de um futuro não muito distante, causa inúmeras discussões sobre o feminismo, teocracia, sociedade em um formato completamente atual e aplicável aos dias de hoje.

Antes de enxergar esse futuro distópico, a atmosfera da série pode causar, pela fotografia, figurino e comportamentos, uma sensação de que, ao invés de tratar de anos à frente, trata-se de um recorte de um passado grotesco, que pelo menos boa parte da sociedade ocidental atual já superou. Porém, ao perceber os dilemas presentes nesse futuro apresentado pela série, é possível compreender que, na verdade, a série busca mostrar o futuro com problemas extremamente atuais. Vale ressaltar, que Margaret Atwood, autora do livro “O Conto de Aia”, que inspirou a série, começou a escrevê-lo em 1985 – e o lançou em 1987 -, inspirada por eventos que de fato aconteceram.

Os principais acontecimentos que incidiram no pensamento de Atwood foram o crescimento do ultraconservadorismo religioso americano, a queda do muro de Berlim e a Revolução Iraniana, em 1967, que fincou o Estado Islâmico e passou a oprimir ainda mais as mulheres.

A história, que retrata uma nova teocracia cristã impositiva nos Estados Unidos, mostra uma república chamada Gilead, construída após o governo norte-americano ser derrubado para dar lugar a um governo que dizia seguir leis baseadas nas palavras da Bíblia Cristã.

A drástica mudança política acontece após uma queda de extrema relevância nos índices de fertilidade, o que poderia levar a humanidade a uma descontinuidade da espécie. Nesse novo cenário, em que poucas famílias conseguem procriar, é de se imaginar, então, que as mulheres férteis sejam glorificadas ou tratadas como prioridade. Porém, em vez disso, o governo as toma de sequestro e as tortura, numa espécie de treinamento intensivo, para que sirvam como um corpo produtor de filhos para as famílias da alta sociedade de Gilead.

Da atuação à direção, as mulheres brilham

Desde a autora do livro que deu origem a série, The Handmaid's Tale traz grandes mulheres para dar vida à produção

Por Lyla Pires

Dessas mulheres, são tirados os seus próprios nomes, quando recebem uma nova diretriz. A partir de agora serão tratadas como propriedade dos senhores das famílias ricas. A personagem central, que se chama originalmente June, passa a se chamar Offred, que nada mais é do que “Of Fred” (de Fred Waterford). O nome de June, porém, é original da adaptação para TV, pois, no livro, o nome real de Offred não é revelado em hipótese alguma.
Daqui, a narrativa se desenvolve do ponto de vista de Offred, personagem principal interpretada por Elisabeth Moss. A personagem, representante legítima do empoderamento feminino, descreve, a cada linha de pensamento, a revolução interna que desenvolve após ser doutrinada para servir à família Waterford ou a qualquer uma outra que fosse destinada. O olhar de Offred nos traz uma perspectiva mais profunda e carregada da trajetória das aias, termo usado para denominar as jovens mulheres, que são utilizadas com a finalidade da procriação.

Da rotina da personagem e das demais aias às abduções, até as cenas de estupro romantizado, que acontecem nos rituais de fecundação – chamados na série de cerimônias -, Moss traz, em abundância, uma carga de sentimentos, admiração e desconforto para o espectador.  A interpretação da atriz lhe rendeu inúmeros prêmios em 2017 e 2018, entre eles um Emmy e um Globo de Ouro.

Já não deveria se considerar necessariamente fácil assistir à primeira temporada de The Handsmaid Tale. Após o sucesso, aclamada pela crítica de uma temporada baseada no livro de Margaret Atwood, a série volta, em um contexto mais abrangente. Uma fase ainda mais pesada da produção.

A temporada que estreou no dia 25 de abril, retorna trazendo algumas respostas às dúvidas que ficaram do último episódio da temporada anterior. A última cena é exatamente o fim do livro, e, por isso, o destino de June e das aias de Gileade, na segunda temporada, estava nas mãos dos roteiristas da série. Por fim, conseguiram manter a atmosfera da produção, tornando-a ainda mais incômoda de assistir, pelos inúmeros desconfortos que ela traz acerca do nosso comportamento e da sociedade em que vivemos hoje.

A autora da obra, Atwood, fez uma breve aparição na primeira temporada. Além disso, ela é uma das produtoras da série, o que abrilhanta ainda mais o fato de a maioria dos episódios serem dirigidos por mulheres. O destaque pode ser dado a Reed Morano, também responsável por Lemonade da Beyonce, que ganhou um Emmy pela direção do episódio piloto “Offred”.

A música como ferramenta

Orquestra infanto-juvenil transforma o cotidiano de crianças e adolescentes através da música em São Gonçalo do Amarante

Por Ana Beatriz Caldas

Além de planejar e analisar o impacto de seus produtos e serviços na vida dos usuários, também é papel essencial das empresas do setor privado auxiliar no desenvolvimento sustentável das comunidades onde estão localizadas. Cada vez mais, a preocupação com ações de responsabilidade social empresarial  tem se tornado mais forte em entidades de médio e grande porte, que investem parte de seus recursos em iniciativas de educação, arte e esporte em todo o País, capacitando pessoas e realizando sonhos.

Seguindo esse preceito, e com o objetivo de melhorar a qualidade de vida de crianças e adolescentes de São Gonçalo do Amarante, a UTE Pecém tem realizado uma série de ações voltadas para o desenvolvimento artístico e profissional da comunidade de Várzea Redonda, distrito do município, através do Instituto EDP. Dentre elas, uma tem feito sucesso particular entre os participantes: a Orquestra Infantojuvenil de São Gonçalo do Amarante, núcleo de formação musical da Orquestra Contemporânea Brasileira (OCB), também apoiada pela entidade.

Atualmente, a atividade atende 100 crianças e adolescentes do município, com idade entre sete e 16 anos, e também possui turmas em Fortaleza e Pindoretama. “Nós acreditamos que a música pode transformar vidas. Essas crianças estão em situação de extrema vulnerabilidade e, provavelmente, jamais teriam acesso a esses instrumentos e à oportunidade de aprender a tocá-los. A arte ocupa um espaço vazio e faz com que elas possam navegar em um mundo desconhecido”, explica a analista de Responsabilidade Social da EDP, Danielle Araújo.

Promover capacitação educacional e profissional para a juventude através do contato com a arte ameniza fatores que contribuem para o reforço de estigma, reduzindo índices de desigualdade social e criminalidade, e são ações que podem reverberar positivamente no cotidiano de toda a comunidade. Para Danielle, esse deve ser um dos principais pilares de empresas que se instalam em áreas vulneráveis. “A empresa não se desenvolve sozinha. Se ela não tiver em um ambiente em que a comunidade está se desenvolvendo bem, a empresa não está crescendo, só acumulando riqueza”, ressalta.

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Valores educacionais multidisciplinares

Durante as aulas de violino, contrabaixo, viola e violoncelo, que ocorrem duas vezes por semana em uma igreja da comunidade de Várzea Redonda, os alunos da Orquestra Infantojuvenil de São Gonçalo do Amarante também aprendem a ter disciplina, a se dedicar mais para obter resultados e reforçar o foco nos estudos, valores compartilhados com toda a comunidade e que podem fazer diferença no futuro de dezenas de famílias.

O projeto, que está no segundo ano consecutivo na cidade, tem apoio da Lei Rouanet e é coordenado pelo maestro Arley França, que trabalha com projetos sociais que ensinam música a crianças e jovens há mais de 20 anos. Tudo começou quando Arley se envolveu com a área através de um projeto social em Fortaleza ainda adolescente.

“A oportunidade que eu tive foi a primeira porta para trabalhar com música e veio a determinar tudo o que aconteceria profissionalmente na minha vida. Essa experiência me tornou uma pessoa diferente e me fez querer transformar a vida das pessoas”, conta.

Os professores do projeto, músicos profissionais de alto nível, são responsáveis pelas três horas de aula semanais de cada aluno. Segundo Arley, uma das principais funções da orquestra é tirar os alunos da ociosidade, conhecendo uma nova cultura.

“Tenho raízes em São Gonçalo e soube dessa comunidade a 30 km da cidade com várias crianças ociosas, sem nenhuma oportunidade ou acesso. Quando fui lá e conheci as crianças, senti a mesma coisa que senti quando pensei em começar meu primeiro projeto, que elas precisavam de um projeto que mudasse suas trajetórias”, completa.

Aprendizado musical

A curiosidade pelos instrumentos diferentes foi, inclusive, o motivo pelo qual Marcelle Martins, de 14 anos, resolveu participar do projeto. Para ela, a orquestra foi a oportunidade perfeita para descobrir um mundo novo – além da prática do instrumento, ela pontua que os passeios feitos com os membros da orquestra são sua parte favorita do processo do aprendizado musical. “A música me transformou em uma pessoa mais calma e atenciosa. Através dela, consigo expressar os meus sentimentos”, afirma a garota, que pretende seguir trabalhando com arte.

Apesar de muitas crianças e jovens terem interesse em uma carreira profissional como músicos, para participar da orquestra é necessário investir também na educação formal básica. Para garantir o direito à educação a todos, os alunos devem estar matriculados em uma escola e cultivar boas notas. Além disso, durante a prática musical, valores que auxiliam a formação escolar – e, futuramente, profissional – são repassados às crianças de maneira multidisciplinar, operando no lado emocional e cognitivo.

“Uma criança que estuda música potencializa uma inteligência múltipla, facilitando o aprendizado de línguas estrangeiras e conhecendo muito sobre cultura, de uma maneira geral, e sobre o contexto social, cultural e político da construção de cada música. O nosso projeto, na realidade, é de transformação social. A música é apenas uma ferramenta”, pontua.