Histórias pelas lentes fotográficas

Por três de cada imagem há sempre uma história. No Dia do Repórter Fotográfico, 2 de setembro, os profissionais do Grupo de Comunicação O POVO contam o que houve nos bastidores de seus registros favoritos.

Por Larissa Viegas Por Gabriela Custódio

Hoje, 2 de setembro, é celebrado o Dia do Repórter Fotográfico. Responsáveis por traduzir em imagens os fatos do dia a dia, esses profissionais têm a sensibilidade, a destreza e a inteligência de eternizar momentos que ficaram na memória (minha, sua e até de uma nação).

Para comemorar a data, convidamos os profissionais do Grupo de Comunicação O POVO para apresentar seus registros favoritos, citar as histórias por trás das imagens e dar dicas para fotógrafos e apreciadores da arte.

Aurélio Alves

"[Escolhi a foto] por conta da relação do homem com o mar. Eu sou louco pelo mar, que, para mim, é muito lúdico, um sonho." E dele estava saindo o personagem da fotografia de Aurélio Alves, que se prontificou a mostrar as qualidades dos peixes recém-pescados, na tentativa de vender os produtos. Para o fotógrafo, a imagem desperta a ideia de lutar pelos próprios objetivos diariamente, pois o pescador "vai em busca do alimento e não sabe se volta". A mensagem serve de motivação para ele. "O pescador vai, conquista o objetivo dele e volta. É mais ou menos isso que eu quero fazer da minha própria vida", finaliza.

 

Para Alves, é necessário prever os possíveis contratempos e se preparar para eles. Para isso, deve-se conhecer o equipamento e as possibilidades de uso dele. "A dica que eu tenho é essa: você se blindar ao máximo e sair sabendo o que vai fazer." O fotógrafo indica, ainda, a palestra "O drama silencioso da fotografia", de Sebastião Salgado, no evento TED2013.

Camila de Almeida

Em uma de suas primeiras viagens pelo Jornal O POVO, Camila de Almeida fez este registro em Quixadá. A história de José Grilo, um dos personagens que convivem diariamente com a seca, tocou a repórter fotográfica. O personagem atravessa todos os dias o açude do Cedro para vender suas garrafas de leite. No barco, a bicicleta é sua companhia e seu meio de transporte dos dois lados do açude. "Gosto da foto porque ele estava voltando para casa e me deu tchau espontaneamente. E estava morto de feliz porque tinha vendido todas as garrafinhas", conta Camila.

 

Estude técnica, mas não fique preso a ela. "Você só aprende a fotografar fotografando. Se você quer ser um fotógrafo, tem que estar na rua e tem que aprender a lidar com os problemas, inclusive com segurança. E não deixar de fotografar por causa disso. Vá nem que seja com celular, Cybershot. O importante é exercitar o olhar em ambientes que são diferentes para você", diz Camila.

Ethi Arcanjo

O ensaio Preto, Branco & Rosa foi assinado em 2015 por Ethi Arcanjo. Feito com mulheres mastectomizadas, ele foi pensando com o intuíto de não mostrar "o lado sombrio das mulheres que tiveram câncer de mama, mas que pudesse ser real, cru e que, ao mesmo tempo, servisse para resgatar a autoestima de cada mulher que passou por esse processo, que infelizmente fica fragilizada em algum momento da doença", explica a fotógrafa. As cicatrizes expostas traziam também superação, recomeço, beleza, inspiração e até sensualidade. "Eu me senti extremamente agradecida por elas me permitirem retratar isso de uma forma tão leve, bonita e natural", conclui.

 

Para Ethi, a fotografia vai além da câmera, da técnica e dos cursos. "Acho que independente do nível que o fotógrafo se encontra, ele deve encontrar o seu estilo e, antes de tudo, ser autocrítico. É válido acreditar no seu potencial. O sentimento de plenitude para mim tá relacionado ao fim, à acomodação, ao marasmo. É importante ser inquieto e pensar sempre no que pode melhorar."

Fábio Lima

Em 2008, Antônio Jussivan Alves dos Santos, conhecido como Alemão, foi preso pelo assalto ao Banco Central. A chegada dele a Fortaleza rendeu a Fábio Lima um registro marcante. Enquanto toda a imprensa se concentrou na entrada da garagem, o fotógrafo arriscou entrar no prédio para ter acesso ao carro por outro ângulo. "Quando eu abri a janela e olhei para baixo, lá estava o Alemão. Fiz três fotos sem flash para não chamar atenção. Depois coloquei o flash, ele olhou para mim e logo me tiraram de lá." O resultado foi a satisfação pessoal por sair do lugar comum e conseguir a foto que ninguém tinha. "É muito gratificante. Eu vibrei muito."

 

"É uma dica que eu dou para quem faz fotojornalismo: não arme a cena." De acordo com Fábio Lima, esse profissional apenas registra uma imagem que já existe. O fotógrafo precisa ser paciente, ficar atento e "procurar" o registro sem interferir nas cenas. Se não conseguir, "volte sem a fotografia, mas não faça uma coisa que não existe".

Evilázio Bezerra

"A câmera estava no pescoço e só fiz duas fotos sem ver. Não fiz mais nada, dada à comoção da garota. (...) Quando cheguei na redação, falei que tinha uma imagem muito forte e que ficaria a critério do editor publicar ou não." A fotografia da moça, que é parente de engenheiro civil vítima de um assalto, foi publicada na capa da edição do dia seguinte. À época, Evilázio Bezerra ficou inquieto e preocupado com a reação dela e da família ao verem a imagem na primeira página. Porém, dias depois, a família declarou que a imagem era uma forma de denúncia. "Isso me deixou tranquilo", afirma o fotógrafo. "É uma fotografia pesada e instigante sobre a violência que ronda todos nós", finaliza.

 

Sempre olhar muitas referências é uma das dicas para quem está começando a carreira. "Toda fotografia tem uma informação." Também é importante estar atento às notícias, acompanhar fotografias publicadas em jornais e conhecer as pessoas com as quais pode se deparar no cotidiano, como secretários e políticos. "Isso, no campo de trabalho, na rua, ajuda muito."

Francisco Fontenele

A foto escolhida por Fco Fontenele foi em 2014, durante a partida entre Brasil e Colômbia, em Fortaleza, na Copa do Mundo de Futebol. "Foi justamente o momento em que o Neymar se machucou e ficou fora [do evento]. A partir dele, a seleção passou a viver momentos de grande indecisão. Eu acho que a confiança ficou abalada", descreve. Além do momento, Fontenele explica que a foto também é importante pelo fator exclusividade, já que apenas ele e um outro profissional registraram a contusão. Durante toda a partida, o fotógrafo esteve literalmente focado no atleta. "Peguei toda a sequência", afirma.

 

"Tudo sobre fotografia", de David Campany e Juliet Hacking, é o livro indicado por Fontenele. "É uma coletânea de todas as fotos históricas. Eu recomendo para qualquer amante de fotografia", apresenta. Para os cinéfilos, ele recomenda também o filme "Repórteres de guerra".

Iana Soares

"Uma das coisas mais bacanas de ser fotógrafo no jornalismo é poder se aproximar da história de pessoas." Por isso Iana Soares destaca o retrato de três meninos vaqueiros, parte do especial Sertão a Ferro e Fogo. A reportagem partiu das marcas de ferro a gado como um ícone da cultura cearense para abordar outros temas, como o processo de colonização do Estado e da atualização da tradição local. "Fiz foto e vídeo deles correndo, brincando com boi e montando a cavalo, mas gosto muito desse retrato, que é uma pausa para oferecer uma imagem à câmera. [...] Acho que tem muita coisa acontecendo nele, inclusive o futuro desses meninos."

 

"A dica principal é você ser curioso e estar atento ao mundo que você tem diante dos olhos." Iana acrescenta, ainda, que o fotógrafo deve ser generoso, não só com o mundo, mas consigo mesmo. "Saiba que você está sempre aprendendo." Além disso, a repórter afirma que é importante estudar a técnica para fazer fotos boas de forma intencional, e não por acaso.

Julio Caesar

Com coletes, capacetes e muita ansiedade, Julio Caesar cobriu o seu primeiro confronto. O cenário era uma rebelião de presos na unidade prisional Desembargador Francisco Adalberto Barros de Oliveira Leal (CPPL do Carrapicho). Do lado de fora, crianças e mulheres pediam informações de seus companheiros. "Além da foto ter sido capa do jornal, o que me tocou foi a luta daquelas mulheres que não abandonam seus companheiros e, mesmo do lado de fora da prisão, brigam, lutam e colocam-se frente às armas, travam uma guerra pelos seus. A foto tem para mim uma carga emocional que a faz especial, que traduz o que eu queria: a captura de momentos que se eternizam no click da minha 'arma', nas lentes da minha câmera. Me senti naquele momento fotojornalista."

 

Henri Cartier-Bresson entrou para a história como um dos maiores fotojornalistas do mundo. Julio Caesar indica dois documentários do francês: "The Impassioned Eye" e "Just Plain Love". O fotógrafo também participa da série "Contatos - A grande tradição do fotojornalismo", junto com outros 12 grandes profissionais, discutindo, diante de suas folhas de contato, seus métodos de trabalho.

Mateus Dantas

Em abril de 2016, os moradores da comunidade do Gengibre, no bairro Dunas, tiveram suas casas alagadas. Resultado de um dos primeiros trabalhos de Mateus Dantas para O POVO, a imagem mostra "um pouco de cada morador que estava ali" ao registrar os pertences que seriam deixados para trás. Para ele, a fotografia retrata uma realidade em Fortaleza nos períodos de chuva. "Enquanto uns estão no conforto, outros estão passando um aperreio danado", comenta. "Foi uma pauta que mexeu muito comigo. [...] Eu passei por aquilo e senti o que eles estavam sentindo. A dor de perder as coisas e ter que se renovar depois das chuvas."

 

Ver centenas de fotos de diferentes fotógrafos e buscar apreender os elementos delas é uma das dicas de Dantas. "No cotidiano, vou aplicando aquilo que extrai das fotos que vi." Ele indica também o filme "Repórteres de guerra" para quem está iniciando na profissão. "Foi o primeiro filme que assisti sobre fotografia e me motivou muito. Lembro que, no final, pensei: 'é isso que quero para a minha vida?'"

Tatiana Fortes

O registro da Tatiana Fortes foi em março de 2016, no período em que a imprensa destacava os casos de bebês com microcefalia. Apesar das várias fontes, apenas esta mãe aceitou ser fotografada. "A mãe passou por uma série de preconceitos, mas tentou seguir de uma maneira bonita mantendo a gravidez e o bebê, com dignidade e força. Eu acho que nosso papel enquanto fotojornalistas significa responsabilidade, respeito e cuidado. Dois meses depois, ela ligou para agradecer pela matéria, mas disse que a filha tinha falecido. Na verdade não é a gente que faz, elas que dão a foto para a gente, quando se colocam à disposição."

 

Como forma de compreender um pouco o trabalho do fotojornalista, Tatiana indica o filme "Mil vezes boa noite". "Tem tudo a ver com qualquer fotógrafo ou com quem queira trabalhar com fotojornalismo. Ele me marcou porque fala muito da gente, das dores que passamos ao entrar em cada história e o tanto que levamos para nossas vidas."

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