DILMA ROUSSEFF

Tudo que você precisa saber sobre o processo do impeachment

Por Letícia Alves

 

A votação que decidirá se o impeachment de Dilma Rousseff (PT) já acontece neste domingo, 17, na Câmara dos Deputados. Mas ainda restam muitas dúvidas sobre esse processo que tem influenciado na instabilidade política, econômica e institucional do País.

Se você perdeu os acontecimentos, ainda pode ficar por dentro de tudo o que aconteceu na política nacional, de Brasília a Curitiba, e do que sucede a votação. O POVO preparou um resumo com os principais fatos, personagens, prisões, delações e leis para não parecer que você estava viajando para Marte nos últimos meses.

 

 

Básico do básico
Antes de tudo, é importante saber que: o que está sendo votado na Câmara dos Deputados ainda não é o impeachment da presidente da República, mas apenas uma aprovação à abertura do processo – que ainda precisa ser confirmado pelo Senado.

Se não for aprovado no plenário da Casa, ele será arquivado – o que não significa que Dilma terá se livrado totalmente de ser afastada do cargo. Novas acusações à presidente, no entanto, podem gerar novo pedido de impeachment, como aquele que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) protocolou.

Os próximos passos:
Contrariando a ordem cronológica dos fatos, o ideal mesmo para entender tudo é começar do final. Ou, nesse caso, do que ainda pode acontecer.

1.Na sexta-feira, 15, o processo de impeachment chegou ao Plenário da Câmara dos Deputados. Sessão estava programada para começar às 8h55. A acusação e a defesa terão 25 minutos cada para expor argumentos. Depois, cada partido teve uma hora de fala que pôde ser dividida em até cinco parlamentares.

 

2. Os pronunciamentos dos partidos chegaram até a noite do sábado, 16. O tempo de fala foi dividido em várias sessões, com direito a tempo de lideranã em cada uma delas. O resultado foi uma sequência de sessões de 34 horas direito, a mais longa da história da Câmara.

 

3. O parecer será votado neste domingo, 17, com previsão de início para as 14 horas. Os votos serão nominais, ou seja, expressos por cada deputado verbalmente. Cada líder terá tempo para encaminhar os votos das suas bancadas, com tempo proporcional ao tamanho e cada uma delas. Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que presidirá a sessão, anunciou que a chamada será feita por estado na seguinte ordem:

1. Roraima
2. Rio Grande do Sul
3. Santa Catarina
4. Amapá
5. Pará
6. Paraná
7. Mato Grosso do Sul
8. Amazonas
9. Rondônia
10. Goiás
11. Distrito Federal
12. Acre
13. Tocantins
14. Mato Grosso
15. São Paulo
16. Maranhão
17. Ceará
18. Rio de Janeiro
19. Espírito Santo
20. Piauí
21. Rio Grande do Norte
22. Minas Gerais
23. Paraíba
24. Pernambuco
25. Bahia
26. Sergipe
27. Alagoas


4. Na Câmara, o processo pode seguir dois caminhos: se aprovado por dois terços dos deputados, que somam 342, ele é aberto e segue para decisão final no Senado. Se o governo conseguir barrar abertura, processo é arquivado.

5. Indo para o Senado, a Casa decide se o processo é finalmente aberto. Para isso, basta que a maioria simples vote a favor dele. O Senado tem até a primeira quinzena de maio para realizar a votação.

6. Depois de aberto o processo, a presidente da República é afastada do cargo por até 180 dias, prazo do Senado de decidir se Dilma é culpada ou inocente das acusações de crime de responsabilidade. Nessa fase, o vice Michel Temer (PMDB) assume o cargo temporariamente.

7. A sessão do Senado, que decide se Dilma permanece na presidência, será presidida por Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). A saída precisa ser aprovada por dois terços dos senadores, 54 no total. Se o número não for alcançado, Dilma volta imediatamente ao cargo.

Quais motivos podem levar à queda da presidente

 

Depois de entender o que pode acontecer com Dilma, é importante saber o que pode levá-la a cair. Apesar de instabilidade causada pela Operação Lava Jato, que colocou o PT no centro de escândalos de corrupção na Petrobras e gerou uma série de prisões, acusações e delações envolvendo políticos e empresários que financiaram vários partidos nas últimas eleições, não é isso que pode afastar Dilma da presidência.

 

O que poderia incluir as investigações no pedido de impeachment seriam as acusações feitas na delação premiada do ex-senador petista Delcídio do Amaral. Cunha, no entanto, preferiu deixa-las de fora do processo para não se ver obrigado a adiar votação.

O impeachment, segundo a Lei n° 1079, acontece sob o cometimento de crime de responsabilidade. As principais acusações contra a presidente são de praticar as chamadas “pedaladas fiscais” e de assinar seis decretos no valor de R$ 2,5 bilhões para complementar o orçamento anual de 2015.


Desenvolvimento
Depois de aprender o que pode vir a acontecer com Dilma e o porquê, é hora de relembrar tudo que já aconteceu. Os principais fatos e datas que marcaram a crise desde a reeleição da presidente em 2014 e os personagens dessa história.

Conheça os fatos - linha do tempo da crise

 

26/10/2014 - Dilma Rousseff (PT) é reeleita presidente da República com diferença de apenas 3,3% para Aécio Neves (PSDB)

01/2/2015 - Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é eleito presidente da Câmara. Em discurso, promete que será "independente" do governo

03/03/2015 - Rodrigo Janot, procurador-geral da República, protocola pedido no STF para abertura de inquérito de políticos suspeitos de envolvimento na corrupção da Petrobrás

15/3/2015 - Mais de 2 milhões de pessoas participam de protestos em todo o País contra o governo de Dilma. Foi a maior manifestação deste ano contra a presidente.

27/5/2015 - Integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL) enviam pedido de impeachment à Câmara dos Deputados

17/7/2015 - Eduardo Cunha anuncia rompimento com o governo

23/9/2015 - Eduardo Cunha apresenta rito para o processo de impeachment, com votação fechada

02/10/2015 - A presidente Dilma anuncia reforma ministerial, e PMDB fica com oito pastas, formando base de apoio no Congresso para o governo

07/10/2015 - Tribunal de Contas da União (TCU) recomenda que Congresso reprove as contas do governo de 2014

13/10/2015 - Ministros do STF Teori Zavascki e Rosa Weber concedem três liminares que suspendem rito de impeachment definido por Cunha em setembro. A justificativa foi que o presidente da Câmara não teria analisado recurso apresentado por governistas contra o rito

21/10/2015 - Parlamentares da Oposição entregaram pedido de impeachment a Eduardo Cunha. Ele foi elaborado pelos juristas Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT,Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal

03/11/2015 - Conselho de Ética da Câmara instaura um processo contra Eduardo Cunha

02/12/2015 - Eduardo Cunha autorizou abertura do processo de impeachment. O despacho do peemedebista autorizando a abertura do impeachment ocorreu no mesmo dia em que a bancada do PT na Câmara anunciou que vai votar pela continuidade do processo de cassação de Cunha no Conselho de Ética. (Foram, pelo menos, 15 pedidos de impeachment, já contando com o último, enviado pela OAB)

07/12/2015 - Temer envia carta a Dilma em que se diz "vice-decorativo" e aponta fatores de desconfiança do governo em relação a ele e ao PMDB

08/12/2016 - Em votação secreta, a Câmara dos Deputados elegeu, por 272 votos a 199, chapa alternativa integrada por deputados de oposição e dissidentes da base governista para a comissão especial do impeachment

17/12/2015 - O STF anula chapa alternativa e decide que a comissão especial do impeachment só pode ser formada por indicados por líderes de partidos

1°/2/2016 - Câmara protocola um recurso contra decisão do STF que barrou o rito de impeachment estabelecido.

13/3/2016 - Protesto pelo impeachment de Dilma ganha status de maior manifestação da história do País ao levar cerca de três milhões de pessoas `s ruas em todo o País

16/3/2016 - O STF rejeita recurso da Câmara e mantém decisão sobre rito de impeachment e chapa avulsa; Planalto anuncia Lula como ministro da Casa Civil

17/3/2016 - Câmara elege, em votação aberta, os 65 deputados da comissão especial; Dilma é notificada para que apresente defesa; acontece posse de Lula como ministro

18/3/2016 - STF barra posse de Lula na Casa Civil

22/3/2016 - Ministro do STF Teori Zavascki determina que Sérgio Moro envie para o Supremo investigação sobre Lula

29/3/2016 - Em reunião que durou menos de três minutos, PMDB anuncia rompimento com o Governo Federal

04/4/2016 - O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, apresentou defesa de Dilma na comissão. O documento tem cerca de 200 páginas

06/4/2016 - O relator do processo Jovair Arantes (PTB-GO) leu parecer favorável ao impeachment na comissão

11/4/2016 - Comissão especial da Câmara aprova abertura do processo do impeachment; vazamento de áudio em que Temer discursa “à nação” como se Câmara já tivesse aprovado abertura do processo.

 

Personagens da crise

 

1. Dilma Rousseff (PT): presidente da República, a protagonista. Acusada de cometer crime de responsabilidade, o que, por lei, pode causar impedimento dos membros do Poder Executivo.

2. Luís Inácio Lula da Silva (PT): ex-presidente da República, alvo de investigações da Operação Lava Jato e líder do Partido dos Trabalhadores, no centro dos escândalos de corrupção. Engrossou o discurso governista de que impeachment seria “golpe”.

3. Michel Temer (PMDB): vice-presidente da República, primeiro da linha sucessória de Dilma. Acusado de “golpista” pelos governistas, por supostamente estar agindo para incentivar impeachment. Teve carta e áudio vazados que engrossaram o argumento, em que na primeira cobra mais “confiança” da presidente e, no segundo, discursa como se impeachment já tivesse sido aprovado na Câmara dos Deputados

4. Eduardo Cunha (PMDB-RJ): presidente da Câmara dos Deputados, ex-aliado do PT e também alvo de investigações da Lava Jato. Além disso, tem processo em andamento contra ele no Conselho de Ética da Casa, que pode cassar seu mandato. Responsável por acolher e acelerar o processo de impeachment da presidente, recusar pedido de abertura de impeachment do vice Michel Temer e estender o próprio processo contra ele. Conhecido por utilizar de inúmeras “manobras” para isso.

5. Renan Calheiros (PMDB-AL): presidente do Senado, e aliado ao governo. Falou várias vezes que o impeachment da presidente era “golpe”, unindo seu discurso ao de parlamentares da base.

6. Sérgio Moro: juiz federal responsável pela Operação Lava Jato. Apesar de não ter participação direta na abertura do processo contra a presidente, tornou-se o “herói” nas manifestações contra o Governo Federal. Foi responsável pela prisão de inúmeros petistas e pela polêmica condução coercitiva de Lula e divulgação de áudios de conversas do ex-presidente com Dilma, que influenciaram as pressões pró-saída dela.

Ações da operação Lava Jato que intensificaram a crise

 

15/4/2015 - João Vaccari Neto, tesoureiro do PT, é preso por suspeita de receber propina em corrupção na Petrobras

03/8/2015 - José Dirceu é preso acusado de ter cometidos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha

25/11/2015 - A Polícia Federal prende Delcídio do Amaral (PT), líder do governo no Senado, por suspeitas de obstruir investigações

23/2/2016 - Marqueteiro do PT João Santana e da mulher dele, Mônica Moura, são presos acusados de receber dinheiro de propina da Petrobras em conta não declarada no exterior

03/3/2016 - Vazamento da delação do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), em que ele acusa Dilma e Lula de interferência na Lava Jato

04/3/2016 - Cumprimento de um mandato de condução coercitiva contra Lula

16/3/2016 - Juiz responsável pela Operação, Sérgio Moro, divulga série de áudios de interceptações telefônicas de Lula. Conversa entre o ex-presidente e Dilma que indicaria manobra para conseguir foro privilegiado leva milhares de pessoas às ruas em todo o País para pedir a saída de Dilma.

Acusações contra Cunha e contra Lula

 

Enquanto Dilma enfrenta acusações de crimes de responsabilidade, o presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ), principal opositor do governo e o ex-presidente Lula (PT), principal aliado da presidente, são investigados por envolvimento nos escândalos de corrupção.

 

 

1. Lula
Triplex no Guarujá

Lula teria recebido, em 2014, R$ 1 milhão da construtora OAS, por meio de reformas e da aquisição de móveis de luxo no triplex 164-A do Condomínio Solaris, no Guarujá. O ex-presidente nega que seja proprietário do imóvel. Para o MPF, a suspeita é de que os móveis e a reforma "constituam propinas decorrentes do favorecimento ilício da OAS no esquema da Petrobrás".

Sítio em Atibaia
Ele teria recebido dois sítios contíguos em Atibaia, no valor de R$ 1,5 milhão. Segundo o MPF, haveria "fortes indícios" de que o ex-presidente teria recebido R mil em reformas e móveis nos sítios, entre 2010 e 2014, "sem razão econômica lícita" pelo empresário José Carlos Bumlai e as empreiteiras OAS e Odebrecht, favorecidos no esquema de corrupção.

Armazenagem de itens retirados do Palácio do Planalto
Indícios de pagamentos dissimulados de R$ 1,3 milhão pela empresa OAS em favor de Lula, de 2011 a 2016, para a armazenagem de itens retirados do Palácio do Planalto ao fim do mandato do ex-presidente.

Instituto Lula e LILS Palestras
As empresas Camargo Correa, OAS, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e UTC, envolvidas no esquema de corrupção na Petrobras, teriam doado R$ 20,7 milhões ao Instituto Lula, que alega que as doações foram legais e devidamente declaradas. A saída de recursos teria beneficiado pessoas vinculadas ao PT e familiares do ex-presidente.

 

2. Cunha

 

Contas não declaradas na Suíça
Cunha e familiares seriam beneficiários de quatro contas em um banco na Suíça, com saldo de 2,4 milhões francos suíços (cerca de R$ 8,7 milhões), supostamente vindo de propinas.

Propina em contrato na África
O parlamentar teria recebido, no Exterior, 1,3 milhão de francos suíços (R$ 4,7 milhões) em propina proveniente de contrato de exploração de petróleo da Petrobras em Benin, na África.

 

Propina de navios-sonda
Delator da Operação Lava Jato, o executivo Júlio Camargo disse aos investigadores que Cunha cobrou dele o pagamento de US$ 5 milhões em propina para viabilizar contratos de navio-sonda da Petrobras.

Propina de obra do Porto Maravilha
Paira ainda a suspeita de que Cunha teria recebido propina de R$ 52 milhões do consórcio formado por OAS, Odebrecht e Carioca Christiani Nielsen Engenharia, que atuava na obra do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro.

Processo de cassação
Ele é alvo de um processo de cassação por quebra de decoro parlamentar, por ter mentido aos outros parlamentares quando afirmou à CPI da Petrobras que não era dono de contas no Exterior, fato contestado por documentos obtidos pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

O rito do impeachment

E agora, voltaremos ao começo. Entenda o rito desde a aceitação do processo por Eduardo Cunha (PMDB-RJ) até agora

 

1) Cunha acolhe um dos pedidos

2) Comissão especial é instalada uma comissão com deputados de todos os partidos, em número proporcional ao tamanho da bancada de cada legenda. Ela foi formada após indicações dos líderes de partidos (sem chapas avulsas)especial na Câmara para analisar o pedido

3) A presidente tem até 10 sessões para apresentar defesa (sessão: qualquer sessão deliberativa ou não aberta com quórum de 51 deputados

4) Após defesa, comissão terá 5 sessões para votar relatório final, com parecer contra ou a favor da abertura do processo (já houve 4 sessões)

5) Depois de 48 h da publicação, o parecer é incluído na Ordem do Dia da sessão seguinte do plenário

6) No plenário, o processo de impeachment será aberto se dois terços (342) deputados votarem a favor

7) Aberto o processo de impeachment, ele segue para aprovação ou reprovação no Senado Federal. Na Casa, será formada Comissão Especial, aos moldes do que ocorreu na Câmara. Neste caso, a comissão será formada por 21 senadores. Depois de apreciar o caso, ele deverá ir a Plenário, onde precisa de maioria simples para continuar. Se os 81 senadores estiverem presentes na sessão de votação, será preciso pelo menos 41 votos a favor do impeachment para afastá-la por 180 dias.

8) No Senado, a sessão que decidirá sobre o impeachment será presidida pelo presidente do STF. Só é aprovado se dois terços (54) do Senado votar a favor

9) Se absolvida no Senado, a presidente reassume o mandato imediatamente; se condenada é automaticamente destituída.